terça-feira, 27 de julho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTINUAÇÃO (parte 46 de 51)


assessor especial da Presidência da República. Novamente, tudo muito próximo de Lula. A lambança não prosperou.
Trechos de depoimento da então prefeita de São José dos Campos (SP), Ângela Guadagnin (PT), são publicados pelo jornal O Estado de S. Paulo. Ela desmentiu, nove anos atrás, a versão de que Paulo Okamotto jamais assediou administrações municipais petistas, para obter dinheiro e engordar o caixa 2 do PT. Ângela Guadagnin foi ouvida por uma comissão do PT, após a acusação de Paulo de Tarso Venceslau. Ex-secretário de Finanças do governo de Ângela Guadagnin em São José dos Campos, Venceslau disse que a Cpem (Consultoria para Empresas e Municípios), empresa ligada ao advogado Roberto Teixeira, compadre de Lula, vendia serviços a prefeituras petistas e, em troca, recheava os cofres do PT com dinheiro de caixa 2.

Em 7 de junho de 1997, Ângela Gadagnin admitiu que Paulo Okamotto solicitou uma lista de fornecedores da cidade, com vistas a arrumar contribuições para o PT. O testemunho dela, porém, por decisão do presidente do partido na época, ex-deputado José Dirceu (SP), não provocou maiores consequências. Trecho gravado:

- Ângela, deixa eu perguntar uma coisa. Falando do Paulo Okamotto, ele em algum momento procurou você, falando de fornecedores, querendo saber de fornecedores da Prefeitura para fins de captação de recursos para o partido?
- Procurou.
- E ele queria saber o quê?
- Exatamente quais ele poderia procurar para ver se podiam estar ajudando, coisa assim.
- Ele perguntou a relação de fornecedores da Prefeitura para que ele procurasse, para ajudar financeiramente o partido, é isso?
- Sim.

- Ele procurou?
- Sim.
Agora, trecho do depoimento de Paulo Okamotto à comissão. Ele mesmo descreve como fazia as abordagens:
- Você está contente com essa política, quer que essa política continue, ganhe, está a fim de contribuir para isso? Então nós vamos pedir para o nosso cara de finanças procurá-lo, tudo bem?
Dia 332
10/4/2006 O advogado Rogério Buratti concede entrevistas aos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo. Reconhece que se reuniu “três vezes no máximo” com o ex-ministro Antonio Palocci (PT-SP), na “casa dos prazeres”. Buratti vinha negando isso. Agora, fala abertamente: a mansão do Lago Sul era “ponto de apoio pessoal”, principalmente para empresários de Ribeirão Preto (SP) que estavam em Brasília. Dá como exemplo ele mesmo, que representava a empresa Leão Leão, e nomeia Roberto Carkos Kurzweil, da Rek, Ruy Barquete, da Procomp, e José Roberto Colnaghi.
Para Buratti, a casa foi um erro. “O objetivo não foi atendido, só deu problema”. Ele fala ao repórter Mario Cesar Carvalho, da Folha:
- As pessoas que frequentavam a casa à noite, como amigos, levavam acompanhantes boa parte das vezes. Isso não significa que havia festas e que as festas tinham objetivos comerciais. Essa foi uma das grandes dificuldades para admitir a existência da casa. Acabou parecendo que era a casa dos prazeres. Cada pessoa que tem atividades em Brasília e quer receber uma acompanhante não precisa ter uma casa. Essa atividade que o Francenildo disse haver certamente deve ter havido. Duas, três ou quatro pessoas que levaram umas meninas para a casa... Atividades que não são comerciais, são particulares.
- Isso não tinha a ver com lobby? Quem pagava as garotas?
- Cada pessoa que frequentava a casa e resolvia levar uma garota de programa ou não para dentro da casa se responsabilizava pelo pagamento da garota. Na verdade, está sendo revelada por meio da casa uma atividade cotidiana em Brasília. As meninas que frequentavam aquela casa, hoje continuam frequentando outros lugares em Brasília e fazendo a mesma coisa.

Buratti diz acreditar que “as empresas” que usaram a casa “devem ter contribuído” com as despesas de manutenção do local. Cita a Rek, a Procomp e as empresas de Colnaghi.

- Por que o ministro não reconhece que frequentou a casa?

- Porque a casa ganhou contornos morais. As negativas dele devem ter a ver com esse aspecto moral. Eu sempre neguei na CPI que tivesse visto o ministro na casa porque isso criou um constrangimento muito importante na minha vida. Até hoje as pessoas falam que minha atual namorada é uma menina que frequentava a casa em Brasília, e não é verdade. Essa questão, como me incomoda até hoje, por invadir a privacidade, deve ter incomodado o ministro.
- Por que só agora o senhor decidiu revelar que viu Palocci na casa?
- O ex-ministro Palocci é uma pessoa por quem tenho profundo respeito. A questão fundamental: há ou não há ilicitude na casa? Se desde o começo a gente tivesse tratado isso com tranquilidade... “Olha, eu frequentei aquele imóvel, amigos meus de Ribeirão buscavam fazer negócios a partir dele, mas não há atividade ilícita que eu tenha feito ali...” Resolvi falar porque não vejo mais isso como um problema. Admitir isso deve tranquilizar as pessoas. O que deve ser focado é se houve negócios ilícitos a partir da casa que devam ser investigados? Se as pessoas encontravam mulheres, é um problema particular delas, não um problema público.
Buratti conta ao repórter Ricardo Brandt, do Estadão, que conversou com Palocci dentro da “casa dos prazeres” sobre o caso do contrato entre a Caixa Econômica Federal e a multinacional Gtech. Fala de Ralf Barquete, importante auxiliar de Palocci em Ribeirão, levado no início do governo Lula para a Caixa. Ele também cita Marcos Andrade, ex-executivo da Gtech. O repórter indaga sobre pedido de interferência no contrato. Buratti responde:
- Quem foi procurado pela Gtech foi o Ralf, dentro da Caixa. Até porque o Ralf já estava na casa. Ele tinha informações limitadas a respeito desse processo, pois ele estava lá havia um mês. Eles buscavam um contato com alguém vinculado ao Palocci, porque eles estavam buscando relações com o governo. E quando eles me procuraram em São Paulo, o Marcos Andrade simultaneamente, eles buscam um contato dentro da Caixa com alguém vinculado ao ministro Palocci. E aí são indicados a falar com o Ralf.

- Você estava atuando como lobista nisso, então?

- Eu atuava como executivo da Leão Leão...

- Mas eles não te procuram como executivo da Leão...

- O Marcos Andrade me procura como um eventual lobista para eles dentro da Caixa, em função da notícia de que eu teria relacionamentos. Essa notícia de que eu teria relacionamentos eles me informaram que tiveram em São Paulo. Na cidade de São Paulo, através de pessoas do PT. Tanto que o primeiro contato foi em São Paulo. Essa foi a primeira abordagem diferente que eu recebi. Eles também estabeleceram um segundo caminho através da própria Caixa, que o Ralf me relatou depois. Ele disse que o Jorge Mattoso, num jantar com ele no Blue Tree, disse que a Gtech havia procurado alguém vinculado ao ministro e ele teria dito que o Ralf era esse contato. O Mattoso havia comunicado a ele num jantar no Blue Tree, pois os dois moravam lá na época. O Ralf não quis fazer o contato e falou isso para o Palocci, porque ele estava entrando na Caixa com o objetivo de ser técnico, e não ser representante do Palocci, até porque ele queria outro cargo. Aí ele me pediu para eu ter a conversa com a Gtech. Que eu fosse o porta-voz do que a empresa queria.
- O que a empresa queria?
- A empresa relatou que eles mantinham contato, tinham dificuldade e queriam abrir as portas, pois queriam se relacionar diretamente com o governo e com o PT. E falavam inclusive que estavam sendo procurados por outros grupos do PT, mas que não eram grupos dominantes do ponto de vista do nível de governo.

- Falaram em quem? Em Waldomiro Diniz?
- Não, nunca. Nunca falaram de Waldomiro para mim. Mas falaram de outro grupo e que eles se sentiam incomodados e queriam saber qual era o canal e achavam que o Palocci naquele momento era uma pessoa que pudesse dar uma definição para eles.
- Qual era o acordo?

- A proposta é que fosse renovado o contrato, pois eles iam renovar, mas tinham problemas técnicos a resolver, principalmente vinculados a correspondentes bancários. Eles faziam propostas de que eles poderiam colaborar com o PT.
- Com quanto?
- Aí a proposta variava de fato de R$ 5 milhões a R$ 16 milhões. Não era mais nenhuma sondagem profissional. Eu ouvi essa conversa, relatei para o Ralf e levamos essa proposta. Eu participei dessa conversa. Eu e o Ralf fomos juntos conversar com o Palocci, na casa dele.
- Quando e onde?
- Na casa dele, no final de março, início de abril. Nessa época não existia a mansão, ainda. Era a casa dele. O Ralf frequentava a casa dele. Fomos recebidos por ele e eu relatei a conversa.
Burattti garante que o “negócio” não prosperou.
O presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), e o relator da comissão, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), entregam o relatório final dos trabalhos de investigação ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Na última hora, foram incluídos os pedidos de indiciamento do banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, e da ex-presidente da Brasil Telecom, Carla Cicco. Ambos são acusados por crimes de sonegação fiscal, tráfico de influência e corrupção ativa.

De acordo com Osmar Serraglio, a Brasil Telecom, na época sob controle do Opportunity, injetou R$ 823 mil em empresas de Marcos Valério, por serviços de publicidade que não seriam prestados. Além disso, outros R$ 3 milhões teriam ingressado em contas bancárias de empresas de Marcos Valério, quantia que posteriormente iria ser remetida a empresas no exterior. Existe muito mais dinheiro na jogada, contudo: a Telemig Celular e a Amazônia Celular, pertencentes à holding da Brasil Telecom, repassariam R$ 158 milhões para as agências de Marcos Valério, em cinco anos, por supostos serviços de publicidade. Para o relator, o dinheiro alimentou o valerioduto e serviu para “aparar arestas” entre Daniel Dantas, o PT e o governo Lula.
Dia 333
11/4/2006 O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, divulga a conclusão do inquérito conduzido por ele sobre o escândalo do mensalão. 40 pessoas são denunciadas ao STF (Supremo Tribunal Federal) em decorrência das investigações. O procuradorgeral endossa acusações da CPI dos Correios, mas seu relatório proporciona impacto maior.
Afinal, ele não poderia ser acusado de agir por ambições políticas, partidárias ou eleitorais.
Logo na introdução da denúncia, os acusados. Entre os nomes, 20 “estrelas”. A relação:
José Dirceu, Luiz Gushiken, José Genoino, Delúbio Soares, Silvio Pereira, Marcos Valério, João Paulo Cunha, Pedro Corrêa, José Janene, Valdemar Costa Neto, Professor Luizinho, João Magno, Anderson Adauto, Duda Mendonça, José Borba, Carlos Rodrigues, Zilmar Fernandes da Silveira, Simone Vasconcelos, Henrique Pizzolato e Roberto Jefferson.
Antonio Fernando de Souza ressalva que “todas as imputações feitas pelo ex-deputado Roberto Jefferson ficaram comprovadas”. Investigações “evidenciaram o loteamento político dos cargos públicos em troca de apoio às propostas do governo, prática que representa um dos principais fatores do desvio e má aplicação de recursos públicos, com o objetivo de financiar campanhas milionárias nas eleições, além de proporcionar o enriquecimento ilícito de agentes públicos e políticos, empresários e lobistas que atuam nessa perniciosa engrenagem”.
Capítulo à parte, em seguida, trata exclusivamente do relatório do procurador-geral  da Repúlica.
Dia 335
13/4/2006 O editorial “Um libelo arrasador”, de O Estado de S. Paulo, comenta a denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Para o jornal, Lula é o “beneficiário por excelência da corrupção em escala inédita promovida pelo PT”. O editorial responsabiliza o presidente da República, por ser “impossível imaginar que não tivesse conhecimento”:
“O que torna absolutamente críveis as conclusões do trabalho, além da manifesta isenção do seu autor, é a consistência da análise da engrenagem por trás dos crimes perpetrados, com o entrelaçamento dos ramos político-partidário, publicitário e financeiro da quadrilha. Mas a denúncia convence acima de tudo por sua irrepreensível objetividade. É o que a distingue do relatório final da CPI dos Correios. Este, embora também tenha comprovado a prática do mensalão, foi uma conta de chegar, como costumam ser os resultados das investigações parlamentares, produto ao mesmo tempo de fatos apurados e pressões, ou negociações, políticas.”
“Nada remotamente parecido com isso influenciou o inquérito dirigido pelo procuradorgeral.
A independência e a seriedade com que agiu transparecem na simplicidade do seu texto, desprovido dos contorcionismos verbais ou do estilo barroco presentes no documento da CPI. Com sujeitos, verbos e predicados em ordem direta, Antonio Fernando de Souza dispensa eufemismos e chama as coisas pelos nomes – a começar do mais arrasador deles, ‘quadrilha’. Está lá: ‘compra (pelo PT) de suporte político de outros partidos’ e ‘financiamento irregular de campanhas’.”
Dia 337
15/4/2006 A revista Veja comenta a denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza: “Ali estão escritos em detalhes e com precisão jurídica os mecanismos de funcionamento do que talvez seja – com exceção da nomenklatura soviética – a maior quadrilha jamais montada com o objetivo de garantir a continuidade no poder de um mesmo grupo político, o PT de Lula. A hierarquia da quadrilha descrita pelo promotor tem como chefe José Dirceu, deputado cassado por corrupção que foi ministro-chefe da Casa Civil de Lula. Abaixo dele estão quase todos os ‘companheiros de luta’ de Lula, gente com quem ele conviveu intimamente por quase três décadas. O procurador-geral deixou vago no organograma da quadrilha o posto logo acima de José Dirceu. Mas o quebra-cabeça não é de difícil solução. Basta montar as peças e aparece o mais provável ocupante daquele posto. É isso que aponta o bom senso. Basta tentar montar com as peças do quebra-cabeça uma outra imagem que não a de Lula. Não encaixa”.
Para Veja, é evidente que o presidente era o beneficiário do esquema que tinha como objetivo sustentar o projeto de poder do PT: “O novo quadro desmonta a principal defesa de Lula, que sempre disse desconhecer todas as ações ilegais e clandestinas em torno do mensalão”. A revista afirma: “Afinal, se estava alheio a tudo, podese inferir sem exagero que Lula desconhecia como se construía o apoio a seu governo e ignorava o que faziam seus principais auxiliares. Um presidente pode ser enganado por autores da corrupção que ocorre num ministério de importância média comandado por um aliado recém-chegado – mas é inverossímil que não seja informado sobre o que se faz no coração de seu governo, uma instituição como a Casa Civil, comandada por um homem como José Dirceu, a quem ele mesmo chamou de ‘capitão do time’.
Por não atender aos mínimos requisitos lógicos, o dilema de saber ou não saber tornou-se questão ultrapassada. O que se precisa investigar agora é como Lula se articulava com o bando dos 40. Que relações financeiras tinha com o ‘chefe da quadrilha’,o deputado cassado José Dirceu?”

Nenhum comentário:

Postar um comentário