quinta-feira, 22 de julho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTINUAÇÃO (Parte 41 de 51)

- Sim, claro.
- (...) O Samek não põe a gente pra dentro do jogo. Vai tomar no c...

- Eu também acho. Podia ter chamado...

- Não. Podiam falar: “Ó, tamo fazendo...”

- Então...

- E aí pegar como doação de campanha, mesmo...

- Hum-hum.

- Com gosto.

- Hum-hum.
A reportagem esclarece que Jorge Samek integra o seleto grupo de amigos de Lula.

Costuma participar de churrascos e festas na Granja do Torto. Samek já foi próximo de Bertholdo. Pegou carona em viagens para Brasília no jatinho do advogado, na época em que Bertholdo fazia parte do Conselho de Administração de Itaipu. Agora, Bertholdo está preso em Curitiba. É acusado de vários crimes, entre os quais grampear um juiz federal, vender sentenças judiciais, lavar dinheiro, fazer tráfico de influência e o de torturar o ex-sócio Sérgio Renato Costa Filho, para se apoderar das fitas gravadas por ele.
Dia 296
5/3/2006 O jornal Correio Braziliense reproduz trechos de uma conversa gravada. Nela, o ex-motorista do senador Romero Jucá (PMDB-RR), Roberto Jefferson Marques, admite ter feito saque de R$ 50 mil na agência do Banco Rural do Brasília Shopping. Na fita, Marques comenta sua ida ao banco:
- Eu só cheguei lá e disse: “Meu nome é Roberto Jefferson Marques”. Aí, o cara falou:

“Ah, tudo bem”. Só isso. E me entregou um envelope amarelo, grampeado em cima. Não bri, não fiz nada.
De acordo com a gravação, o motorista, conhecido como “Xuxa”, recebeu determinação do senador, que foi ministro da Previdência Social do governo Lula, para fazer a retirada no Banco Rural. O dinheiro deveria ser entregue a um certo homem, identificado como Magela.

Assim Marques procedeu.

A reportagem, de Luciene Soares, Rodrigo Lopes e Marcelo Rocha, conta que Marques ficou assustado com a eclosão do escândalo do mensalão. Romero Jucá tratou de desligá-lo do gabinete em Brasília, e tirá-lo da capital federal. Ele foi para Belém, onde passou mais de um mês. Sem trabalho, voltou a procurar o senador. Sem sucesso. O Correio Braziliense relata:
“A fita cassete em que Roberto Marques faz as revelações foi gravada no final de outubro  de 2005, durante uma conversa no interior de um veículo. O interlocutor de Marques, que fez a gravação, prefere não se identificar. Marques estava desempregado. Depois que tomou conhecimento do que dizia seu ex-motorista, o senador voltou a empregá-lo. Hoje, ele trabalha na Prefeitura de Boa Vista, cuja titular é Tereza Jucá, mulher de Romero Jucá.

Agora, Marques nega ter feito saques a pedido do senador. Afirma desconhecer qualquer coisa relacionada ao assunto.”

Dia 299
8/3/2006 Mais um escândalo. Em depoimento à CPI dos Bingos, Francisco Chagas da Costa, motorista que trabalhou entre março de 2003 e fevereiro de 2004 para a “república de Ribeirão Preto”. Ele prestou serviços a assessores e outras pessoas ligadas ao ministro Antonio Palocci (PT-SP) em Brasília. São eles: Ademirson Ariosvaldo da Silva, Rogério Buratti, Vladimir Poleto e Ralf Barquete. Afirma ter visto o ministro “três vezes, mais ou menos”, na chamada “casa dos prazeres”, alugada no Lago Sul. Diz o motorista:
- Foi lá, ia lá. Mas não em festa. Durante o dia, mas sem festa. Não sei o que ia fazer. Foi poucas vezes. (...) Umas três vezes, mais ou menos. Eu o vi entrando na casa.

Recorda-se que, em janeiro, Antonio Palocci foi questionado pelo senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), relator da CPI dos Bingos, sobre a casa alugada por Poleto, que pagou R$ 60 mil em dinheiro pela locação, um adiantamento equivalente a seis aluguéis. No depoimento de Palocci, o relator perguntou:

- Vossa excelência não esteve nenhuma vez na casa que ele alugou no Lago Sul?
- Aqui em Brasília?

- Sim.

- Não, nenhuma vez.

- A casa que era utilizada para reunir empresários.
- Não estive nenhuma vez.

Francisco Chagas da Costa afirma que Antonio Palocci foi à “casa dos prazeres” sem carro oficial. Usava o automóvel Peugeot de Ralf Barquete, assessor da presidência da Caixa Econômica Federal, nomeado para o cargo por influência de Palocci. Ralf Barquete foi um auxiliar importante de Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto (SP). Outra declaração espinhosa do motorista:
- Eles faziam festa e levavam as meninas para a casa. Eu levei as meninas, sim. Várias vezes. Deixava lá.

As “meninas” são garotas de programa, agenciadas por Jeany Mary Corner. Perguntado se a conhecia, o motorista afirma:

- Essa era a mulher que arrumava as meninas para a casa. Fazia festas e levava para a casa. Cheguei a vê-la duas vezes.
Francisco Chagas refere-se a Ademirson Ariosvaldo da Silva. Descreve como o secretário particular de Antonio Palocci se referia ao ministro:

- Eu ouvia falar: “Tenho uma reunião com o chefão”. “Temos de falar com o chefão tal hora”. Podia ser ele, eles não falavam ministro Palocci, não. Falavam chefão. Quando queriam falar com o chefão, pediam para ir ao Ministério da Fazenda.

O motorista relata que transportou duas vezes para a “casa dos prazeres” o empresário Roberto Carlos Kurzweil, dono do automóvel no qual teriam sido transportados dólares de Cuba para o PT. Uma terceira vez levou-o do hotel em que estava hospedado ao Ministério da Fazenda, para onde também se dirigiram dois empresários de jogo angolanos. Seriam José Paulo Teixeira Figueiredo e Artur José Valente Caio. Segundo Rogério Buratti, eles fizeram uma doação de R$ 1 milhão em caixa 2 para a campanha de Lula em 2002.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, Rogério Buratti volta a confirmar o jantar do qual participaram Antonio Palocci e os dois empresários angolanos, em 2002. Foi em São Paulo na casa de Roberto Carlos Kurzweil, que conhecia o ministro desde 1991. Uma das empresas dele, a Rek, cuidava da coleta de lixo em Ribeirão Preto, quando Palocci era vereador do PT. Eleito prefeito, Palocci aumentou o número de serviços prestados pela Rek. Diz Rogério Buratti:
- Soube desse jantar por causa das relações que tinha com o Palocci. Eu não vi o dinheiro para a campanha ser entregue, mas essas coisas ninguém vê. Mas tenho certeza absoluta de que a contribuição aconteceu. Não tenho dúvidas.

Em votação secreta, a Câmara dos Deputados absolve dois parlamentares acusados de envolvimento no escândalo do mensalão. Roberto Brant (PFL-MG) recebeu R$ 102 mil do esquema de Marcos Valério. O dinheiro foi sacado por um assessor, Nestor Francisco de Oliveira. O outro deputado absolvido é o Professor Luizinho (PT-SP), cujo assessor José Nilson dos Santos fez retirada de R$ 20 mil do valerioduto. Roberto Brant recebe 283 votos a favor da absolvição. Outros 156 deputados pedem a cassação do mandato. Necessita-se de pelo menos 257 votos para efetivar a cassação. Luizinho teve 253 votos pela absolvição e 183 pela perda do mandato.
Outros dois deputados já haviam sido absolvidos pelo plenário da Câmara: Sandro Mabel (PL-GO) e Romeu Queiroz (PTB-MG). E quatro renunciaram para fugir da cassação:
Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (PL-RJ), José Borba (PMDB-PR) e Paulo Rocha (PT-PA). Apenas dois foram cassados: Roberto Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu (PT-SP).

Depois da absolvição, festa para Luizinho. Amigos reúnem-se no apartamento do deputado Devanir Ribeiro (PT-SP). Estão lá o líder do PT na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), e os deputados João Paulo Cunha (PT-SP) e Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP).

Também participam da confraria o ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT-SP), o prefeito de Santo André (SP), João Avamileno (PT), e a assessora especial da Presidência da República, Miriam Belchior. O evento é fechado à imprensa. Diz Luizinho:

- Não vou querer ficar fazendo festa com algo que não se pode festejar. Seria uma falta de sensibilidade.

Depoimento à CPI dos Correios. Lúcio Funaro, apontado como antigo dono da corretora Guaranhuns, afirma ter ouvido comentários no mercado financeiro, segundo os quais João Vaccari Neto, integrante da direção da CUT (Central Única dos Trabalhadores, ligada ao PT), é o responsável por operações mantidas pelos fundos de pensão Petros (dos funcionários da Petrobras), Previ (Banco do Brasil) e Funcef (Caixa Econômica Federal). Lúcio Funaro é investigado por ter provocado prejuízos de R$ 100 milhões aos fundos de pensão. Declaração de Lúcio Funaro:

- O que ouço no mercado é que o João Vaccari, que foi presidente do Sindicato dos Bancários e é ligado ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e ao governo do PT, seria o responsável pela operação desses fundos. O Marcelo Sereno seria o responsável pela operação dos fundos menores.
A Polícia Federal encaminha ao STF (Supremo Tribunal Federal) inquérito que apurou o escândalo do mensalão. Traz 226 depoimentos em 4.500 páginas. Há 40 pessoas relacionadas para indiciamento, entre políticos, empresários, operadores do mercado financeiro, lobistas e servidores públicos. Cinco pessoas são citadas: Duda Mendonça, Marcos Valério, José Genoino, Delúbio Soares e Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil.
Dia 301
10/3/2006 Em entrevista à Folha de S.Paulo, o advogado Roberto Bertholdo, ex-assessor parlamentar do PMDB e ex-conselheiro da Itaipu Binacional, afirma ao repórter José Maschio que o deputado José Janene (PP-PR) e o doleiro Alberto Youssef têm esquema para retirar dinheiro de estatais e destiná-lo ao pagamento de mensalões.
Roberto Bertholdo, que trabalhou no gabinete do ex-líder do PMDB na Câmara, exdeputado José Borba (PR), diz que José Janene e Alberto Youssef são donos da corretora Bônus-Banval, envolvida no escândalo do mensalão. Segundo Bertholdo, 80% dos recursos adquiridos via corrupção eram transformados em dinheiro vivo, por meio da corretora. Ele aponta para o deputado Eunício Oliveira (PMDB-CE), que foi ministro do presidente Lula:
- Quando o Eunício Oliveira assumiu o Ministério das Comunicações, o Janene e o  Youssef me apareceram com o currículo do diretor da Bônus-Banval, Breno Fischberg, e outro corretor da Bônus, para que o PMDB indicasse um deles à presidência do Postalis.

Eles queriam armar um amplo esquema no governo. Nós não aceitamos.

Bertholdo afirma ter visto Alberto Youssef levando sacolas com dinheiro ao apartamento do deputado José Janene, em Brasília:

- Por pelo menos três vezes. Uma vez, ele abriu uma sacola para mostrar algo ao Janene e vi que eram reais. Uma outra vez, as sacolas eram tão pesadas que a Cleide, a cozinheira do Janene, teve que ajudar o Youssef a levar as sacolas para um aposento interno do apartamento.
Segundo Roberto Bertholdo, o dinheiro era para pagar parlamentares da base aliada do governo Lula:

- Quem ele pagava e os nomes que ele me passou, eu só falo ao procurador-geral da República. Mas ele e o Youssef operavam muito dinheiro.

Dia 302
11/3/2006 A revista Veja revela a identidade do ex-aliado do advogado Roberto Bertholdo, entrevistado na semana anterior. Trata-se de Antonio Celso Garcia, o “Tony Garcia”. Ele conta ao repórter Alexandre Oltramari que foi candidato a senador e tinha Roberto Bertholdo como suplente em sua chapa. Não se elegeu e acabou preso, acusado de cometer fraude em consórcio. Em troca da liberdade, passou a colaborar com a Justiça. Atraía Bertholdo para conversas gravadas pela polícia. A entrevista de Tony Garcia:
- Como o senhor soube que Bertholdo pagava o mensalão do PMDB?
- Ele me falava que tinha encontros semanais em São Paulo com pessoas que operavam essas coisas com o PMDB.
- Com quem eram os encontros?
- Com Delúbio Soares, Silvio Pereira e Marcelo Sereno. Ele me dizia que falava mais com o Silvio Pereira e o Delúbio.
- O Marcos Valério não aparecia?

- Bertholdo nunca falou dele. O Valério não era fonte dele. Ele dizia que a fonte dele era mesmo a direção do PT.

- Onde eram os encontros?
- Em escritórios ou hotéis. O Meliá era um deles. O escritório era o do Silvio Pereira. Ele tinha um escritório fora da sede do PT. Bertholdo tinha reuniões quase que religiosamente às segundas-feiras.
- O que acontecia nos encontros?

- Bertholdo dizia que tratava de indicações políticas do PMDB para o governo e também pegava recursos para fazer acertos dentro do PMDB. Ele dizia que apanhava o dinheiro, em espécie, em São Paulo, e depois o transportava a Brasília em jatos particulares ou alugados.

Voava pessoalmente com dinheiro vivo. Muitas vezes estava acompanhado do assessor, Guilherme Wolf. O Bertholdo nunca andava com menos de R$ 50 mil, R$ 100 mil em dinheiro. Ele falava que era para fazer coisas eventuais, atender um ou outro.

- O senhor sabe quantos deputados do PMDB recebiam dinheiro de Bertholdo?

- Ele deixava claro que eram mais de 50 deputados do PMDB. Mas nunca falou em nomes e eu nunca perguntei porque não era do meu interesse. Os dirigentes maiores do partido, como Michel Temer, eu sei que não participavam, até porque estavam se afastando do governo. Ele só dizia que cada deputado tinha um preço. Havia uns que custavam R$ 10 mil, outros que custavam R$ 15 mil, outros R$ 20 mil, outros R$ 100 mil, outros R$ 200 mil. Que dependia do grau de importância do deputado e das matérias votadas.

- Onde o dinheiro era entregue aos deputados?
- Numa sala ao lado da liderança do PMDB na Câmara, quase sempre à noite. Ou então numa casa que ele alugou no Lago Sul e onde fazia festas para membros do PMDB, PT, ministros... Ele dizia que houve festa até com a presença do presidente da República.
- Mas nunca citou os deputados do mensalão?

- É fácil saber. Basta ver quem eram os deputados do PMDB que votavam com o governo.
Quanto mais polêmicas eram as matérias em votação, e quanto mais o PT deixava de cumprir os compromissos acertados, mais as coisas se complicavam. Bertholdo me dizia que a única maneira de resolver era com dinheiro vivo.
- Então era dinheiro em troca de voto favorável aos projetos de interesse do governo?
- Não só projetos. Ele me disse que levantou R$ 8 milhões junto ao PT para fazer do José Borba líder do PMDB, por exemplo. E tempos depois, quando a turma do Anthony Garotinho destituiu o Borba, ele me disse que gastou outros R$ 6 milhões pagando a deputados do partido para o Borba voltar a ser líder. O caso do “Ratinho” também não é projeto. Bertholdo me contou uma vez que, junto com o Delúbio, estava negociando o apoio do Ratinho ao governo. Depois de um tempo, numa conversa por telefone, ele me disse o seguinte: “Lembra do negócio do Ratinho? Já deu certo. Está fechado. Teu amigo é f... Prestei o maior serviço ao presidente. Inclusive o Ratinho vai ajudar o PT em outras coisas no programa dele”.

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