sábado, 17 de julho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTINUAÇÃO (Parte 36)


Roberto Jefferson dá a sua versão por não ter acusado Lula na época em que denunciou o mensalão, embora agora afirme que já o considerava responsável:
- Sabia que o Lula eu não poderia atingir. Atirei então em volta dele. Peguei firme no Zé Dirceu e no Luiz Gushiken. E a consequência você está vendo.
- O senhor sempre repetiu que o presidente Lula não estava envolvido no mensalão.
Hoje o senhor repete isso?
- Sempre entendi que o Lula sabia, eu só não tinha como provar. Já era difícil confirmar minha versão sem colocar o Lula na história. Se eu o colocasse então, nunca conseguiria afirmá-la. Foi uma estratégia. Atingi em volta, aquele núcleo duro do governo, e preservei o Lula. Bati duro no Zé Dirceu, no Gushiken, no Antonio Palocci, mas aí foi uma correria em cima de mim. Vários empresários do Rio e de São Paulo vieram me pedir para não desestabilizar a economia. Aí não peguei nele.
- Mas de que poderia tê-lo acusado?
- Disse a ele três vezes sobre o mensalão e ele nada fez. E o Palocci ainda tem um agravante, porque o Coaf é subordinado a ele. Se você sacar R$ 100 mil, o Coaf avisa ao ministro. Então, ele não sabia que o Valério havia sacado R$ 55 milhões em dinheiro? É claro que sabia. Mas foi poupado porque o mercado não quer desestabilizar a estrutura que tem favorecido os partidos.
- O senhor falou que foi uma estratégia de defesa não envolver o Lula. Em que ponto o senhor tem certeza da participação dele?
- Os três ministros do núcleo duro dele sabiam, montaram o mensalão, alugaram a base parlamentar. Você acha que o presidente não sabia? Os três mosqueteiros do rei sabiam e o rei não sabia? Eles agiam em causa própria sem que o Lula soubesse? É claro que o Lula sabia.
- O senhor afirma que foi ele que deu a ordem para iniciar o mensalão?
- A inteligência foi feita pelos três ministros do núcleo duro e o Lula aprovou. Eu só não podia provar. Se não acusando o Lula já fui cassado, imagina se eu acuso! Fui ao meu limite.
Dia 220
19/12/2005 A CPI dos Correios investiga fundos de pensão que fizeram operações de última hora para tentar salvar o Banco Santos, no final de 2004. Estão sob suspeita aplicações consideradas atípicas e fora de padrão efetuadas nas duas semanas anteriores à intervenção do Banco Central. Os investimentos seriam questionáveis porque já havia fortes rumores sobre a falta de liquidez do Banco Santos. Não faria sentido investir lá naquele momento.
Funcef (Caixa Econômica Federal), Nucleos (Eletronuclear) e Postalis (Correios) investiram R$ 23,3 milhões em CDBs no Banco Santos, naquele período. Mesmo em 12 de novembro, dia da intervenção, Postalis e Nucleos investiram respectivamente R$ 1 milhão e R$ 1,8 milhão, em títulos privados. Uma semana antes, a Funcef havia aplicado R$ 10 milhões. Naquelas duas semanas, o total de aplicações da Postalis atingiu R$ 9,7 milhões, e o da Nucleos chegou a R$ 3,6 milhões.
Dia 221
20/12/2005 Na véspera da divulgação de relatório preliminar da CPI dos Correios, o empresário Marcos Valério vem a público informar que recorreu à Justiça. Quer R$ 100 milhões do PT. Diz que o dinheiro foi emprestado ao partido, sendo R$ 55,8 milhões da dívida original e R$ 44,2 milhões de juros, atualização monetária e encargos financeiros. O extesoureiro Delúbio Soares reconhece os empréstimos e a parceria com Valério, mas a nova direção do PT só admite dívida de R$ 2,4 milhões. É a parcela de uma operação de crédito feita com o BMG supostamente quitada por Valério em nome do PT.
Suspeita-se que o litígio entre Marcos Valério e o PT é forjado. Teria sido intencionalmente ensaiado e posto em prática com a finalidade de confundir e questionar o relatório da CPI. Afinal, se uma parte cobra uma dívida e a outra reconhece parte do passivo, é para fazer crer que os empréstimos de fato existiram e não houve quaisquer simulações nem créditos fantasmas.
Na ação anunciada por Marcos Valério, ele informa ter concedido seis empréstimos para o PT, em nome das empresas SMPB, Graffiti Participações e Rogério Tolentino Associados.

Tudo indica, porém, que os empréstimos são operações de fachada, com o objetivo de acobertar o verdadeiro esquema, ou seja, transações ilícitas e desvio de dinheiro público.

Parte da mesma estratégia, a DNA de Valério apresenta notificação extrajudicial contra o Banco do Brasil. Decide cobrar R$ 13 milhões por serviços que diz ter prestado à Visanet.

Trata-se da soma, segundo a agência, devida e não acertada pelo banco. Vale o mesmo raciocínio: se Valério cobra dívida, faz crer que trabalhou e tem crédito junto ao Banco do Brasil. Questiona a origem do caso Visanet, isto é, o desvio de dinheiro para o PT.

A Assembleia Legislativa do Ceará rejeita, por 23 votos a 16, pedido de cassação do mandato do deputado José Nobre Guimarães (PT-CE). O deputado admitiu ter recebido R$ 250 mil de Marcos Valério, dinheiro não-contabilizado, para a campanha derrotada de José Airton Cirilo (PT-CE) ao Governo do Ceará. O Diretório Nacional do PT negou ter feito o repasse.
Dia 222
21/12/2005 A CPI dos Correios divulga relatório preliminar. Em 411 páginas, o balanço de seis meses de trabalho. De acordo com o relator, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), o mensalão existiu de quatro formas. A primeira delas serviu para fazer repasses semanais de dinheiro. Vinha de contas de Marcos Valério e ia para a corretora Guaranhuns. O destino final, o PL. No primeiro ano da administração Lula, em 2003, foram 24 transferências para o PL, todas entre R$ 200 mil e R$ 500 mil. Ocorreram nos dias 11, 19 e 26 de fevereiro. Em março, nos dias 6, 12, 17, 24 e 31. E em junho nos dias 4, 11, 15 e 18. O último repasse foi em 27 de agosto de 2003. Total: R$ 6,5 milhões. Do relator:
- É o semanadão.

O segundo caminho do esquema, outro padrão de conduta. O mensalão foi usado para repasses e financiamentos a deputados que saíram das legendas pelas quais foram eleitos, e migraram para partidos ligados à base aliada. Entre 3 de abril e 18 de junho de 2003, ocorreram várias transferências de dinheiro para correligionários do PTB. Total: R$ 3,6 milhões.
O mesmo tipo de mensalão engordou a bancada do PP. Entre 20 de janeiro e 18 de fevereiro de 2004, o esquema PT/Marcos Valério lançou mão da corretora Bônus-Banval para intermediar pagamentos feitos em intervalos que variaram de 48 a 72 horas. Os repasses ao PP chegaram a R$ 800 mil.
A terceira forma de mensalão, apontada pela CPI, vinculou repasses de dinheiro a datas de votações de projetos de interesse da administração Lula no Congresso. A sistemática ocorreu de 27 de agosto de 2003 a 15 de janeiro de 2004. No período, foram identificados pagamentos de R$ 15 milhões. Em troca, os parlamentares votaram a favor das reformas da Previdência, Tributária, Lei de Falências e Lei da Cide (Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico), todas defendidas pelo governo Lula.

O derradeiro e quarto caminho da propina foi o pagamento de R$ 6,5 milhões ao PP, por meio de dez repasses efetuados entre 26 de abril e 1 de julho de 2004, pela corretora Bônus-Banval. O relatório traduz o termo “mensalão” como “fundo de recursos utilizado, especialmente, para atendimento a interesses político-partidários”. Do relator Osmar Serraglio:
- Está provado que o mensalão existiu. No caso das votações, não estamos afirmando que houve uma vinculação direta. Estamos mostrando as datas. A inteligência de cada um é que vai dizer.

Um dos pontos considerados mais importantes do relatório preliminar da CPI dos Correios é uma auditoria feita pelo Banco do Brasil. Mostrou a ausência de notas fiscais para comprovar serviços relacionados a R$ 23,2 milhões transferidos à agência DNA. O dinheiro seria usado em campanhas publicitárias da Visanet. O resultado da auditoria indicaria desvio do dinheiro público que acabou no caixa 2 do PT.

Houve coincidência entre as datas de repasses de dinheiro do Banco do Brasil à Visanet, e os empréstimos feitos por Marcos Valério junto ao Banco Rural e ao BMG. Osmar Serraglio aponta desvios de R$ 19,7 milhões, dinheiro enfiado no valerioduto. Numa das operações, os famosos R$ 10 milhões do Banco do Brasil à Visanet, a soma foi para a DNA, depois ao BMG e, em seguida, serviu de garantia a empréstimo que alimentou o caixa 2.

Em outra “coincidência”, o relatório descreve operação perpetrada em maio de 2003 envolvendo R$ 23,3 milhões do Banco do Brasil. O dinheiro foi repassado à Visanet e a empresa de cartão de crédito pagou, nesse valor, serviços adiantados de publicidade à DNA. A agência de Valério, por sua vez, transferiu a quantia para um fundo no Banco do Brasil, e fez empréstimo no mesmo Banco do Brasil. Alguns dias depois, é a vez da SMPB fazer empréstimo no Banco Rural, para alimentar o caixa 2 do PT. Enquanto isso, a DNA quitava o financiamento de R$ 9,7 milhões junto ao Banco do Brasil. Do relator da CPI, deputado Osmar Serraglio:

- Comprovamos a utilização de recursos da Visanet pelo valerioduto, com começo, meio e fim.
A CPI refuta versão de Marcos Valério e Delúbio Soares segundo a qual o caixa 2 foi irrigado por empréstimos bancários. Os supostos empréstimos, jamais devolvidos, teriam servido para justificar dinheiro na contabilidade das empresas de Marcos Valério. O levantamento da CPI constatou repasses de R$ 20,3 milhões à margem de contratos, em benefício das agências de publicidade de Valério. O dinheiro veio da siderúrgica Usiminas e de empresas do Grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas.

O relatório também menciona manipulação do balanço da SMPB, para que a agência pudesse participar de licitação aberta pelos Correios, em agosto de 2003. A empresa de Marcos Valério acabou contratada, com mais duas agências de publicidade, para administrar uma conta anual de R$ 72 milhões. Em outro contrato dos Correios, suspeita-se de R$ 64 milhões superfaturados em serviços com a Skymaster. Osmar Serraglio concede entrevista:
- Tenho o maior apreço pelo PT, mas lamento a forma como vem se conduzindo, no sentido de defender o indefensável. Mensalão e caixa 2 são conceitos que não se excluem.
Lamentavelmente, reconheço que temos um sistema de corrupção de parlamentares.
Dia 227
26/12/2005 O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Roberto Busato, dá entrevista à repórter Lílian Christofoletti, da Folha de S.Paulo. Para ele, o ex-ministro Luiz Gushiken (PT-SP) é o mais próximo de Lula:
- Tudo o que já foi dito demonstra a completa culpabilidade da administração do governo Lula e, o que é pior, atingiu mortalmente o maior amigo do presidente.
Luiz Gushiken é o “confidente do presidente”, pessoa tão íntima que, ao ser envolvido no escândalo do mensalão, deixou de ser ministro mas não foi afastado do Governo Federal.

Lula o nomeou seu assessor especial. Busato:

- A revelação de repasses de verba de publicidade da Visanet, ligada ao Banco do Brasil, a agências de Valério, e de distribuição a parlamentares em épocas apropriadas ao governo, atingiu mortalmente o coração de Gushiken. E, ao atingir Gushiken, atinge Lula, na medida que o presidente não tomou nenhuma atitude para afastá-lo do governo. É prova inconteste de que Lula sabia exatamente de todo o esquema e estava de acordo com a sua existência.

- Em que reside a sua certeza?

- A participação de Lula é absolutamente baseada pela proximidade de quem sempre foi confidente e grande amigo de Gushiken. O ex-ministro realmente comandava toda a área de comunicação do Governo Federal, onde havia um desvio de dinheiro público para atividades partidárias e delituosas no sentido de corromper o Congresso Nacional.
Dia 229
28/12/2005 Divulgado relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras, do Ministério da Fazenda) com o registro de “operações atípicas”, no valor de R$ 93 mil, em nome de Paulo Okamotto. Amigo de Lula e presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Paulo Okamotto apresentou-se como quem, de forma espontânea, resolveu pagar dívida de Lula junto ao PT, no valor de R$ 29.436,26.
O caso é confuso. Na presidência do Sebrae, Paulo Okamotto era sócio-gerente da Red Star, empresa que vende brindes do PT. Foi nesse período que ocorreram as operações atípicas. Levantaram suspeitas porque Paulo Okamotto pagou a dívida, apesar de considerála improcedente. Ainda por cima, disse que não contou nada a Lula. Ou seja, Lula não teria tomado conhecimento de que o problema estaria resolvido. Fica nítida a finalidade de blindar o presidente. Paulo Okamotto trabalha para não envolvê-lo na crise.
Importante acrescentar: depois de jornais publicarem a existência da dívida de Lula, passaram-se quase três semanas antes das primeiras explicações. E Paulo Okamotto se nega a fornecer datas e valores de supostos cheques com os quais teria feito os saques para quitar a dívida. Suspeita-se que o PT usou dinheiro de caixa 2 para pagar os tais R$ 29.436,26.

A história de Okamotto: fez saques em contas bancárias de Brasília, São Paulo e São Bernardo do Campo (SP). Dinheiro vivo. Em seguida, enviou os valores à direção do PT, para pagar a dívida. Okamotto diz que quitou em dinheiro, atendendo a pedido de Delúbio Soares. Tem mais: os depósitos em nome de Lula ao PT foram dispersos por quatro agências diferentes do Banco do Brasil na cidade de São Paulo. Tudo para que passasse despercebido.
Dia 230
29/12/2005 O Tribunal de Justiça de Goiás determina a indisponibilidade do automóvel registrado em nome do ex-tesoureiro Delúbio Soares. É um Omega blindado, importado, ano 2000. A deputada Neyde Aparecida (PT-GO) fica sem um Fiat modelo Palio Weekend, ano 2004. A decisão do juiz Ari Ferreira de Queiroz inclui ainda outros dois veículos, de propriedade de Noeme Diná Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Goiás. A deputada Neyde Aparecida também presidiu a entidade.
Com a apreensão dos carros, o juiz quer assegurar parte do ressarcimento de R$ 165 mil, dinheiro que teria sido repassado indevidamente pela entidade sindical a Delúbio Soares.
Lembramos que ele recebia pagamentos como dirigente sindical em Goiás, apesar de morar em São Paulo e trabalhar, por 16 anos, para o PT. As duas líderes sindicais atestaram que Delúbio Soares comparecia regularmente ao sindicato goiano para dar expediente. Para o Ministério Público, o caso configura enriquecimento ilícito do ex-tesoureiro. Os três são acusados de improbidade administrativa.
Delúbio Soares é demitido do cargo de professor de matemática da rede estadual de ensino de Goiás. Motivo: abandono de emprego.
Emprego há muito não exercido. Delúbio Soares era funcionário-fantasma.
A CGU (Controladoria-Geral da União) divulga as conclusões de auditoria realizada nos Correios. Aponta prejuízos de R$ 121 milhões, em contratos relativos ao transporte aéreo de cargas e à aquisição de produtos e serviços de informática. As irregularidades envolvem o Consórcio Alpha, liderado pela empresa de informática Novadata. Ela pertence ao empresário Mauro Dutra, o “Maurinho”, amigo de Lula. O contrato assinado com o consórcio teria gerado perdas de R$ 35 milhões aos cofres públicos, incluindo a falta de pagamento de multa em 2005, num prejuízo de R$ 22 milhões.
O maior “prejuízo estimado”, de R$ 86 milhões, ocorreu na chamada rede postal noturna.
Houve rombo de R$ 58,8 milhões em pagamentos superfaturados à empresa Skymaster.

Outros descalabros: continuam desativadas 4.324 impressoras adquiridas por R$ 10,4 milhões, três anos antes. Existe pagamento suspeito de R$ 7 milhões para obras em Aparecida de Goiás (GO). Não foram feitas licitações para renovar 1.700 agências franqueadas. E, por fim, inexiste “comprovação da viabilidade econômica” de aditivo contratual assinado com 

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