quinta-feira, 29 de setembro de 2011

No próximo dia 12 de outubro teremos a continuidade do movimento contra a corrupção. Haverá, em todo o país, marchas para mostrar a indignação da população com os roubos e desvios de verbas públicas.
Levantamentos divulgados pela mídia mostram que o ralo da corrupção engole mais de 60 bilhões de reais do orçamento anual. Isso mostra que não precisamos de mais impostos. Precisamos de honestidade e decência. Precisamos de rapidez e seriedade no combate aos saques feitos aos cofres públicos. Precisamos, também, de mais cadeias para as ratazanas.
Em Brasília, no dia 12-10-2011, a partir de 10 horas da manhã, vamos nos concentrar no Museu Nacional da República e dali vamos marchar e mostrar nosso saco cheio com o descalabro.
Peço a todos que divulguem o evento.
Peço a todos que divulguem a idéia da necessidade de combater a corrupção e de criar uma sociedade mais ética, menos desigual e mais justa.
Peço a todos que compareçam à marcha
VAMOS PASSAR O BRASIL A LIMPO

segunda-feira, 26 de setembro de 2011


Sabe quem é Odilon de Oliveira?
Odilon de Oliveira, de 56 anos, estende o colchonete no piso frio da sala, puxa o edredom e prepara-se para dormir ali mesmo, no chão, sob a vigilância de sete agentes federais fortemente armados. Oliveira é juiz federal em Ponta Porã , cidade de Mato Grosso do Sul na fronteira com o Paraguai e, jurado de morte pelo crime organizado, está morando no fórum da cidade. Só sai quando extremamente necessário, sob forte escolta. Em um ano, o juiz condenou 114 traficantes a penas, somadas, de 919 anos e 6 meses de cadeia, e ainda confiscou seus bens. Como os que pôs atrás das grades, ele perdeu a liberdade. 'A única diferença é que tenho a chave da minha prisão!

Traficantes brasileiros que agem no Paraguai se dispõem a pagar US$ 300 mil para vê-lo morto. Desde junho do ano passado, quando o juiz assumiu a vara de Ponta Porã, porta de entrada da cocaína e da maconha distribuídas em grande parte do País, as organizações criminosas tiveram muitas baixas.Nos últimos 12 meses, sua vara foi a que mais condenou traficantes no País. Oliveira confiscou ainda 12 fazendas, num total de 12.832 hectares , 3 mansões - uma, em Ponta Porã , avaliada em R$ 5,8 milhões - 3 apartamentos, 3 casas, dezenas de veículos e 3 aviões, tudo comprado com dinheiro das drogas. Por meio de telefonemas, cartas anônimas e avisos mandados por presos, Oliveira soube que estavam dispostos a comprar sua morte. 'Os agentes descobriram planos para me matar, inicialmente com oferta de US$100 mil.' No dia 26 de junho, o jornal paraguaio Lá Nación informou que a cotação do juiz no mercado do crime encomendado havia subido para US$ 300 mil. 'Estou valorizado', brincou. Ele recebeu um carro com blindagem para tiros de fuzil AR-15 e passou a andar escoltado. Para preservar a família, mudou-se para o quartel do Exército e em seguida para um hotel. Há duas semanas, decidiu transformar o prédio do Fórum Federal em casa. 'No hotel, a escolta chamava muito a atenção e dava despesa para a PF.' É o único caso de juiz que vive confinado no Brasil. A sala de despachos de Oliveira virou quarto de dormir. No armário de madeira, antes abarrotado de processos, estão colchonete, roupas de cama e objetos de uso pessoal. O banheiro privativo ganhou chuveiro. A família - mulher, filho e duas filhas, que ia mudar para Ponta Porã, teve de continuar em Campo Grande. O juiz só vai para casa a cada 15 dias, com seguranças. Oliveira teve de abrir mão dos restaurantes e almoça um marmitex, comprado em locais estratégicos, porque o juiz já foi ameaçado de envenenamento. O jantar é feito ali mesmo. Entre um processo e outro, toma um suco ou come uma fruta. 'Sozinho, não me arrisco a sair nem na calçada..'
Uma sala de audiências virou dormitório, com três beliches e televisão. Quando o juiz precisa cortar o cabelo, veste colete à prova de bala e sai com a escolta. 'Estou aqui há um ano e nem conheço a cidade.' Na última ida a um shopping, foi abordado por um traficante. Os agentes tiveram de intervir. Hora extra. Azar do tráfico que o juiz tenha de ficar recluso. Acostumado a deitar cedo e levantar de madrugada, ele preenche o tempo com trabalho. De seu 'bunker', auxiliado por funcionários que trabalham até alta noite, vai disparando sentenças. Como a que condenou o mega traficante Erineu Domingos Soligo, o Pingo, a 26 anos e 4 meses de reclusão, mais multa de R$ 285 mil e o confisco de R$ 2,4 milhões resultantes de lavagem de dinheiro, além da perda de duas fazendas, dois terrenos e todo o gado. Carlos Pavão Espíndola foi condenado a 10 anos de prisão e multa de R$ 28,6 mil. Os irmãos , condenados respectivamente a 21 anos de reclusão e multa de R$78,5 mil e 16 anos de reclusão, mais multa de R$56 mil, perderam três fazendas. O mega traficante Carlos Alberto da Silva Duro pegou 11 anos, multa de R$82,3 mil e perdeu R$ 733 mil, três terrenos e uma caminhonete. Aldo José Marques Brandão pegou 27 anos, mais multa de R$ 272 mil, e teve confiscados R$ 875 mil e uma fazenda.
Doze réus foram extraditados do Paraguai a pedido do juiz, inclusive o 'rei da soja' no país vizinho, Odacir Antonio Dametto, e Sandro Mendonça do Nascimento, braço direito do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar. 'As autoridades paraguaias passaram a colaborar porque estão vendo os criminosos serem condenados.' O juiz não se intimida com as ameaças e não se rende a apelos da família, que quer vê-lo longe desse barril de pólvora. Ele é titular de uma vara em Campo Grande e poderia ser transferido, mas acha 'dever de ofício' enfrentar o narcotráfico. 'Quem traz mais danos à sociedade é mega traficante. Não posso ignorar isso e prender só mulas (pequenos traficantes) em troca de dormir tranqüilo e andar sem segurança.'

ESTE É O CARA E MERECE NOSSOS APLAUSOS!

POR ACASO A MÍDIA NOTICIOU ESSA BRAVURA QUE O BRASIL PRECISA SABER? NÃO, AGORA SE ELE FOSSE UM BBB OU O JOGADOR DE FUTEBOL... APARECIA EM TUDO!


ESTE SIM, É UM VERDADEIRO BRASILEIRO!!!!

domingo, 25 de setembro de 2011

O PÃO DE CADA DIA

O melhor caminho é aquele por onde teu coração
é presente, por onde teus pés caminham.
O teu caminho torna-se sagrado pelo simples fato
de estares inserido nele.
Nele estão todos os teus humores, tuas vontades,
teus sonhos, tuas alegrias, tuas dores.
Questões já assumidas, outras ainda por trabalhar e outras tantas já esquecidas em algum lugar do teu ser...
Nele tens a capacidade de girar a roda quando desejares, escolhendo outros rumos, outras coisas.
Já pensaste quantos espaços dentro de ti
estão à espera dos teus pincéis,
das tuas tintas, da tua criação?
Já sentiste que tens todos os meios para te lançares naquilo que o teu coração tanto anseia?
Seja um perdão, um pouco de silêncio,
um pouco mais de compreensão, paciência, discernimento, alegria...
Muitas vezes, fechas os olhos para esta realidade,
entregando-te nas mãos de outros para que te cuidem
e te mostrem o caminho pelo qual deves seguir.
Culpas a vida por sentir-te excluído, esquecido,
por não seres agraciado...
Quem pode, realmente. fazer algo por ti,
se tudo depende da tua vontade, do teu querer?
Não há remédio...
Tens que arregaçar as mangas,
sacudir a poeira dos teus pés e prosseguir.
Prosseguir nem que seja no escuro,
sem saber ao certo para onde estás indo...
O importante é não desistires, não estagnares.
Mesmo nos momentos onde te sentes perdido, completamente sem direção, há algo que trabalha em ti
e por ti de uma forma constante.
Lá, por trás das inúmeras sombras, medos
e decepções, algo ilumina...
Algo aprende, algo organiza...
E então, num belo dia, acordas sentindo que
a tempestade passou, que uma leveza encerra
o teu coração num doce balanço...
É... A vida prossegue,
mesmo quando tendes a acreditar
que as tuas forças ficaram lá trás.
Abençoa-te, revigora teu caminho,
pois ele te pertence
e está, definitivamente, sob os teus cuidados.
Não há “outro” para cuidar da tua jornada.
Somente tu podes percorrê-la e vivenciá-la.
Este é o pão de cada dia.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Cecília Meireles
A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.
Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.
Há bosques de rododentros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.
Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.
Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.
Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvi­dos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.
Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.
Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Texto de FREI BETO
 
Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do  Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos e em paz nos seus mantos cor de açafrão.  Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: 'Qual dos dois modelos produz felicidade?'
Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não, tenho aula à tarde'. Comemorei: 'Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho tanta coisa de manhã...' 'Que tanta coisa?', perguntei. 'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula de meditação! Estamos construindo super-homens e super  mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente  infantilizados.
Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'. 'Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?
Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual. Somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. E somos também eticamente virtuais...
A palavra hoje é 'entretenimento'; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se  apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este refrigerante, vestir este  tênis,  usar esta camisa, comprar este carro,você chega lá!' O problema é  que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba  precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.
O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental  três requisitos são indispensáveis: amizades,  autoestima, ausência de estresse.
Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping-center. É curioso: a maioria dos shoppings-centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de  missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas... 
Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Deve-se passar cheque pré-datado, pagar a crédito,  entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo  hambúrguer do Mc Donald...

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: 'Estou apenas fazendo um passeio socrático.' Diante de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:...  
"Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser Feliz"!!! 

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Amigos,
As Nações Unidas promoveram uma campanha para escolha de histórias sobre mulheres que fazem a diferença para a conquista dos Objetivos do Milênio. Um texto das Impressões Amazônicas contando a história da Enfermeira Inácia Freitas que trabalha com os Kaiapó foi escolhida uma das Unsong MDH Hero (Heróis Desconhecidos dos Objetivos do Milênio).

Vejam no site http://www.endpoverty2015.org/en/women-make-it-happen-awards a história de Inácia, que se encontra aqui nas Impressões Amazônicas.
Olá Pessoal, 
Este é outro relato do maravilhoso Dr.Altamiro Vilhena e sua equipe.
Ele é pediatra e anda cuidando dos meninos das várias tribos indigenas.

IMPRESSÕES  AMAZÔNICAS 66
11 de março
A aldeia Manalai já está quase na fronteira com a Guyana e a Venezuela. Se o tempo está bom conseguimos ver daqui o Monte Roraima, o que não é o caso hoje. Aliás, estou nesta aldeia Ingaricó há 5 dias e não tivemos um único minuto de sol. Como estamos na serra, pouco abaixo do Monte Roraima, imaginem o frio. Tentei fotografar hoje pela manhã, mas até as aves também parecem ter se escondido da chuva, me deixando só com meus pensamentos.
Até agora estamos avaliando as crianças e colocando as vacinas em dia. A tarde iremos fazer visitas a domicílio rio abaixo em busca dos idosos e crianças de baixo peso. Tomara que a chuva passe.

Estou no barco e a chuva não dá trégua. Espero que ao menos a gente atenda muita gente. Minha capa de chuva daqui há pouco não vai agüentar mais.

Já fomos a 3 malocas e as crianças já foram pesadas e estão bem. As rocas se espalham ao longo do rio e a terra parece tão fértil quanto as mães. Haja curumim por aqui.
Entro em mais uma maloca. As moradias ingaricó sao bonitas.

Estrutura de madeira coberta de barro. Teto de palha. Janelas mínimas, quadradas. Ambiente único, que é ao mesmo tempo quarto, sala e cozinha. Fogo sempre aceso. Escuridão da falta de luz que se mistura a da fuligem. Os olhos custam a se acostumar. Quando consigo ver descubro uma panela de caxiri no fogo.
Ao seu lado, deitada na rede, uma velha senhora. Os cabelos brancos e a pele enrugada sobre os ossos sugerem pelo menos um século de luta. Lúcida queixa-se apenas de dor de estômago, mas não há como restringir o consumo diário do caxiri apos 96 anos. Dona Catarina me encanta e vale toda chuva e vento que peguei no barco.
Aproveito para registrar o "ciclo" do caxiri. Os diferentes tubérculos, a prensa (tipiti), o cozimento e até o consumo. Não tive como declinar o caxiri com beiju oferecido pela filha de Dona Catarina. A mandioca-macaxeira-aipim é um fruto abençoado da terra e que sustenta muita gente, mas tem outra grande qualidade: e danado de fotogenico, em todos seus estágios.

As meninas sentam na alavanca que aperta o tipiti, fazendo espremer a mandioca. O líquido que sai é coletado, é o tucupi. O que sobra é a massa que vemos abaixo.
Hora de voltar, ainda sob chuva. A sensação de dever cumprido se mescla ao vento e a chuva. Agradeco a Deus, pois é impossivel me sentir mais vivo.
12 de março
Pela manhã nos dirigimos ao malocão para a palestra da saúde.

Ao final, após o tuchaua agradecer fomos convidados para dançar “aleluia”. Já estávamos com fome, mas convite do dono da casa não se questiona, se cumpre. Mais uma vez tentei fotografar sem ter a necessária competência – e um gravador – para registrar este momento único. Som e dança se fundem e nos transportam a outro mundo. Aleluia. Sem dúvida nos aproximamos de Deus nestes momentos. Mas o tempo passou e após cerca de uma hora a perna pesava e a barriga roncava. Nos ofereceram damurida e caxiri. O caxiri, bebida de mandioca, estava pouco fermentada, desceu bem. Me atrevi a tentar a damurida, aquele caldo de pimenta com mais pimenta. Molhei o beiju, provei e… até agora minha boca está ardendo, e provavelmente ainda estará quando você estiver lendo este texto. As risadas das índias vendo meus olhos cheios de água só não eram maiores do que as que davam quando eu tentava dançar “aleluia” com meus dois pés esquerdos.
Aldeia Bananeira – Janeiro de 2011
Acabo de sair do avião e sou literalmente “largado” na pista. Meus anfitriões são o sol e a poeira que a aeronave espalha ao decolar. Procuro uma sombra enquanto espero os moradores da Aldeia Bananeira nos buscarem.
É a primeira vez que venho nesta comunidade e pelo sobrevôo percebi como fica longe da pista. Após quase vinte minutos chega seu Dejanir de bicicleta que me ajuda com a carga e ando cerca de meia hora até chegar a maloca onde ficarei abrigado. Há um sofá de couro legítimo, feito por lá mesmo, remédios pendurados no teto (não me perguntem por que) e frangos com “pulseiras” colorida para os donos os identificarem.
Tomo água, discretamente turva, mas deliciosamente fresca e deixo passar o café. Não preciso de mais calor. Logo ouço o barulho do avião novamente. Engulo mais água e volto a pista, já com meu boné de legionário, protetor solar e disposição. Só não imaginava que precisaria de tanta disposição. Foram caixas e caixas de material odontológico, alimentos e material de enfermagem para ser transportado, trabalho que durou quase três horas em companhia do dentista, enfermeiro, técnica e de alguns indígenas.
Quando acabamos, quase quatro da tarde, nós do primeiro vôo ainda sem comermos, não havia mais como atender ninguém. Assim o resto do dia foi para “arrumar a casa”, preparar refeição, tomar um belo e merecido banho e… descansar.
Jantamos ao entardecer, já de banho tomado. O sol se vai preguiçoso por trás das montanhas e o céu faz um degradê do azul ao negro profundo. Luzes piscam no céu e nos campos ao nosso redor. Não sei se os vaga-lumes que subiram ao céu ou as estrelas que se aproximaram de nós. Mais uma vez penso que estou próximo do paraíso.
Hoje é domingo. A noite traz um clarão maior do que o dos vaga-lumes e estrelas. Um som sobrepuja o do gerador. Pouco a pouco os indígenas se reúnem na igreja, que fica ao lado de onde dormimos. Hinos são entoados com disposição. A Serra do Sol é cristã.
Voltando para casa
O tempo está ruim, mas a viagem é tranquila. O piloto, Chaparral, último a “capotar” um avião em área indígena optou por não abastecer a aeronave para voar mais leve e mais ligeiro. “Acho que vai dar bem, tem pouca carga”, diz ele após descer da asa do avião onde foi conferir o reservatório de gasolina.
O tempo fecha aos poucos, mas só “chacoalhamos” um pouco quando saímos da serra para a região do lavrado. Boa Vista se aproxima e o tempo fecha mais. A solicitação ao pouso é realizada, mas o controle aéreo de Boa Vista nega. “Sem teto. Procure opção alternativa de pouso”.
- Que sem teto o que! – resmunga Chaparral. Ela não está aqui em cima pra ver. Esse povo é doido!
E segue ele dentro da nuvem, sem enxergar absolutamente nada por alguns minutos.
- Dá pra ver tudo, meu parceiro! – resmunga mais uma vez.
Fico com inveja de sua visão de raio-x, pois só o que vejo é um tudo branco. Céu branco, chão branco. Fico feliz pela ignorância branca que me permite não ter idéia do que está acontecendo.
Aos poucos saímos das nuvens e o mundo volta a ter cor.
- O pouso é por sua conta e risco – informa mais uma vez a base aérea de Boa Vista.
Descemos suavemente, sob chuva fina e Chaparral exulta.
- Eu disse, parceiro. Este pessoal do controle de tráfego não enxerga nada.
Abraço no coração,
Altamiro

domingo, 18 de setembro de 2011


Recebi este e-mail de meu querido amigo Ambrogio, que diz assim: Altamiro é um fantástico pediatra que cuida dos meninos dos Indios. Encontrei ele na Índia neste ano.
Ele é um tipo fantástico
Ambrogio 
Impressões Amazônicas 72
O arco-íris forma um anel completo no céu sobre o posto de saúde. O final de tarde é abafado em Santo Antonio do Pão, uma das comunidades da região de Caraparu, onde estou para investigar possíveis causas de morte em crianças menores de cinco anos.
Nunca há uma única causa: dificuldade de acesso, baixo peso, falta de medicamentos, descontinuidade de práticas de cuidados tradicionais são alguns dos fatores envolvidos.

Conversamos em cada comunidade para que os próprios indígenas auxiliem na identificação dos problemas. Escuto opiniões bastante lúcidas:
- A religião atrapalhou a gente, pois os padres e pastores diziam que o pajé “era coisa do diabo”. Aí o que aconteceu?
Em muitos os lugares ninguém sabe mais como fazer para curar o parente.
- Nós não podemos comer estes alimentos congelados, este frango “que já está morto há tanto tempo que a gente nem sabe”.
- A “sacolinha” não resolve a questão indígena. O beneficio que queremos é incentivo a agricultura.
- Tem alguns parentes que bebem muito. A pessoa que bebe se mata pela boca igual peixe.
Quando está na bebida tem palavra forte para falar, aqui na reunião não fala nada.

Estranho o arco-íris sem chuva. Aos poucos se aproxima uma assustadora nuvem cinza-chumbo. Com ela vem o vento. Muito vento, daqueles que formam redemoinhos, bons para pegar saci.
O barulho sacode as árvores e logo toda conversa tem que ser aos gritos. Mas... cadê a chuva?
Do galpão onde estamos vemos pouco mais que algumas gotinhas. Amazônia...nome que só entende quem vive. Em menos de um minuto o que eram gotinhas se tornam chafarizes derramados do céu.
Chuva + vento = vamos tirar correndo as redes que vai encharcar tudo!
Todo mundo se esconde no meio do galpão, mas o vento é grande. Só está protegida a minha barraquinha... Ledo engano, pois a chuva encharca o chão e logo ela está sobre um colchão de água. Vamos ver se ela é mesmo impermeável.
O único consolo é que com o vento os carapanãs e piuns desaparecem.
Tão rápido quanto veio, em pouco menos de quinze minutos a chuva que veio se foi. Logo surge seu Vitalino para ver se estamos bem. Portando um vistoso guarda-chuva de margarida, sorriso no rosto moreno vincado, os cabelos brancos não escondem a idade. Ele é bom de papo e conta como fundou a comunidade, onde todos são filhos e netos. Reclama do beribéri, doença carencial comum na região devido a dieta monótona e o alto consumo de caxiri e que o deixou fraco e sem ânimo para nada, misturando os sintomas da doença com os dos mais de 80 anos. No final pede desculpas pela comunidade não estar tão bonita quanto no tempo que ele era “o cabeça”.
– Meu filho tenta, mas ainda tem muito que aprender comigo.
Pois é... segundo seu Vitalino “Barba-Negra ainda é o rei dos sete mares”.
Atendimento na Aldeia Caraparu 4.
Estou avaliando as crianças quando o Agente se Saúde me chama.
- Doutor, minha mãe está aí fora passando mal, tendo uns “tremeliques”.
Corro para ver o que aconteceu e encontro uma daquelas avozinhas com todos os cabelos brancos que indicam sua quase centenariedade tendo crises de convulsão focal – um provável AVC. O que fazer? Soro para hidratação na veia e oração. Não há mais opções. A pressão está boa e ela logo melhora reclamando apenas de uma leve dor de cabeça.
Dona Ana veio andando debaixo do sol equatorial de onze horas. Quente?
Não. Escaldante. E veio sozinha.
- Mora aonde? – quero saber.
- Ah doutor, logo ali naquela casa.
No final da tarde libero Dona Ana para casa e ela, tão logo se vê livre do soro aperta a mão de todos e se despede. Pega um bastãozinho e sai andando. Vou seguindo com os olhos. Não era “aquela” casa que imaginei. E nem a outra, nem a outra. Ué... Cadê a casa de Dona Ana?
É mais de dez minutos de pernada até o pontinho de adobe se tornar um casa de verdade.
E ela veio sozinha debaixo do sol. 96 anos.
Quando crescer quero ficar igual a Dona Ana.
Agora estamos em Waromada, palavra Macuxi que dá nome a uma pequena rã que mora nas árvores. Esta é a última aldeia que vamos visitar nesta viagem. Estamos em um posto de saúde de adobe, com dois cômodos. Em um ficam as redes das meninas e em outro está minha barraca e a rede do Aldelino. Estou na barraca para escapar dos últimos carapanãs quando escuto um grito:
- Uma cobra!
Enquanto alguns correram “da” cobra” eu corri “pra” cobra, com a câmera na mão. Eu sempre enxoto as cobras, mas esta não teve perdão, afinal estava em uma fresta dentro do posto e saindo do lado das cordas das redes. Uma pazada e a cobra descansou em paz. Jararaca.
Ainda filhote, mas com belas presas.
Alívio. Voltei para o computador, para contar a história.
- Uma cobra!
Ai, ai... será mesmo? Onde tinha uma, tinha outra. E lá fomos nós tentar dar fim de mais uma jararaca. Meus brios de ecologista ferrenho estavam manchados, mas... o que fazer? Lá se foi outra cobra.
Todo mundo perdeu o sono e resolvemos fazer um café.
- Uma cobra!
Já estava ficando mais repetitivo do que desenho do Pica-pau, mas não é que tinha outra? Só a cabecinha... Só que ela ia e voltava, não dava para pegar. Para podermos dormir a solução seria “desmontar” o ninho das cobras, que era exatamente a parede do posto.
E lá fomos nós desmontando a parede até chegar a cobra, desta vez maior que as outras e... menos outra cobra na face da terra.
Onde tem três cobras tem mais? Não sei, mas na dúvida não vamos mais ficar aqui e a noite vai ser no malocão, que é aberto e não tem perigo de cobra nas frestas.

-- XX – XX – XX – XX

Para finalizar uma historinha do hospital, onde atuo em unidade semi-intensiva quando não estou viajando. A vaidade é uma característica de todas as mulheres. As Yanomami adoram se pintar, usar enfeites, se maquilar, o que é muito difícil quando estão nas aldeias.
Assim, no hospital elas pedem de presente batom e esmalte. A alegria de estarem todas enfeitadas é enorme, e não perdem a oportunidade de mostrar para as amigas.
É uma folga de prazer em meio a dor do hospital.

Abraço no coração,

Altamiro
Agora as fotos dos fatos que Dr.Altamiro descreve






 Dr.Altamiro










sábado, 17 de setembro de 2011

Utilidade

O ser humano possui inúmeras necessidades que precisam ser atendidas
para se sentir pleno e feliz.
Algumas são muito elementares e perceptíveis, como alimentação, saúde e segurança.
Outras são mais sutis, mas nem por isso menos importantes.
Por exemplo, sentir-se acolhido e valorizado.
Dentre essas necessidades mais sofisticadas, encontra-se a de ser útil.
Por vezes, ela não é entendida nem por aquele que experimenta a sua carência.
No contexto da sociedade atual, abundam os passatempos e a busca pelo ócio.
As pessoas gastam longas horas em jogos, reais ou virtuais, passatempos e diversões.
São muito comuns as referências a festas que duram a noite toda.
De outro lado, valoriza-se bastante ter a cada dia mais tempo disponível.
Idealizam-se feriados prolongados, viagens e passeios.
         A um olhar superficial, parece que a vida humana se destina primordialmente
         ao recreamento  e ao nada fazer.
Contudo, entre festas e folgas, as crises existenciais e as doenças
psicológicas se multiplicam.
Não se trata de negar a importância do descanso e das atividades lúdicas.
Mas de situá-las em seu devido lugar.
São o contraponto da atividade produtiva, não a finalidade do existir.
A rigor, só descansa quem trabalha.
O ócio, em si mesmo, é vazio e exasperante.
Nada substitui a sensação de plenitude de quem cumpriu o dever,
ao terminar uma tarefa.
A consciência tranquila do dever bem cumprido constitui um prêmio em si só.
Quem logra tornar-se útil sente-se harmonizado com o coletivo.
Percebe que ocupa o seu lugar no mundo e goza de um automático bem-estar.
Assim, tarefas e deveres nobres não constituem obstáculo à felicidade.
Não há lucro algum em evitá-los ou minimizá-los, enquanto se gasta a
vida com futilidades.
Os deveres são parte essencial de um existir equilibrado e pleno.
De outro lado, é importante não confundir utilidade com grandeza.
Quem busca a grandeza costuma se comparar com os semelhantes.
Com isso, tende a se angustiar.
Afinal, sempre há seres com maior e menor preparo e com tarefas
correspondentes ao seu talento.
Em vez de se tranquilizar ao atender seus deveres com competência, rói-se de inveja
de quem é convocado para ocupar posições de maior destaque.
Também corre o risco de desprezar aquele que desempenha tarefas singelas.
Assim, o relevante é identificar os seus compromissos e empenhar-se em bem executá-los.
Cuidar dos próprios deveres com seriedade e competência.
Apreciar a sensação de ser útil e produtivo.
Pense nisso.
Redação do Momento Espírita.
Em 16.09.2011.