domingo, 25 de julho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTINUAÇÃO (Parte 44 de 51)


Os inquilinos teriam dado R$ 22 mil, por meio da Leão Leão, para pagar a primeira parcela da construção de uma quadra de tênis na casa. Não deram a segunda. O dinheiro não foi devolvido. Vladimir Poleto também participou do negócio. A casa
foi visitada por Antonio Palocci antes de ser alugada, de acordo com a reportagem de Andréa Michel e Leonardo Souza. O ministro aprovou o imóvel. A “república de Ribeirão Preto” ocupou a residência por seis meses. Teve problemas com o caseiro.
Diz o corretor Carlos Magalhães:

- Ele foi mandado embora e eles trouxeram um de São Paulo. Eles não quiseram o menino lá mais porque ele estava fofocando, falando que Palocci estava indo lá, que eles levavam mulheres. Aí, no dia em que chegou mudança de São Paulo, com uns quadros, obras de arte, num domingo, o irmão da dona da casa barrou porque não aguentava mais a farra que estavam fazendo.
311
20/3/2006 O delegado Wilson Damázio, da Polícia Federal, admite que foi informado pelo próprio caseiro Francenildo Santos Costa sobre os depósitos em sua conta na Caixa Econômica Federal. Ocorreu na noite de quinta-feira, 16 de março, quando Francenildo pediu proteção policial. Naquela noite, os extratos bancários do caseiro saíram da Caixa. No dia seguinte estavam no site da revista Época. Entre os documentos apresentados por Francenildo à Polícia Federal, o cartão da conta poupança na qual recebera os R$ 25 mil depositados pelo pai. A Polícia Federal é subordinada ao Ministério da Justiça.
A Caixa reconhece que o formulário usado para a extração dos dados da movimentação bancária de Francenildo é exclusivo do sistema interno do banco. Clientes não têm acesso. A quebra do sigilo deu-se dentro da estatal. O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim, decide manter liminar que suspendeu o depoimento de Francenildo à CPI dos Bingos.
Relatório de auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre contrato firmado entre a Petrobras e a empresa GDK apontam favorecimento em licitação e superfaturamento de US$ 23 milhões. O TCU pede a suspensão de pagamentos ainda não efetuados. Os auditores que analisaram o caso recomendam aplicação de multa a Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras, acusando-o de criar dificuldades aos trabalhos de investigação conduzidos pelo TCU, informa reportagem do jornal O Estado de S. Paulo.
O contrato para reformar a plataforma petrolífera P-34, no valor de US$ 89 milhões, foi firmado entre uma subsidiária da Petrobras, a Petrobras Netherlands B.V. (PNBV), e a GDK.
O repórter Diego Escosteguy revela que o contrato estava sob responsabilidade de Renato Duque, diretor de Serviços da Petrobras. A nomeação dele para o cargo teria passado pelo crivo do então secretário-geral do PT, Silvio Pereira. Para obter a celebração do negócio, a GDK teria conseguido informações antecipadas e privilegiadas. Em troca, “Silvinho” ganharia o famoso jipe Land Rover.
Dia 312
21/3/2006 Não se fala em outra coisa em Brasília: a violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa passou pela presidência da Caixa Econômica Federal. Os dados extraídos do sistema da Caixa, com a senha de um alto funcionário, teriam seguido para o assessor de imprensa do ministro Antonio Palocci (PT-SP), jornalista Marcelo Netto, responsável por encaminhar as informações para serem publicadas pela revista Época.
O presidente da Caixa, Jorge Mattoso, subordinado ao ministro Palocci, recusa-se a conceder entrevista. Faz uma semana que Palocci não despacha no Ministério da Fazenda.
Desde que o jornal O Estado de S. Paulo publicou entrevista com o caseiro, Palocci refugiou-se em sala no terceiro andar do Palácio do Planalto, ao lado do gabinete de Lula. Usa entradas e elevadores privativos. Evita contatos com a imprensa. Entra e sai pela garagem do subsolo. Não deixa a sede do Governo Federal nem para almoçar. Seus assessores têm de se deslocar do Ministério da Fazenda até o Palácio do Planalto, para onde também são transferidas ligações telefônicas ao ministro.
Dia 313
22/3/2006 A Câmara dos Deputados absolve o deputado João Magno (PT-MG), acusado de se beneficiar do esquema do mensalão. 201 parlamentares votam pela cassação do mandato, mas outros 207 decidem livrá-lo. A votação é secreta. O parlamentar petista alegou que  os R$ 426 mil recebidos do valerioduto foram usados integralmente em despesas de campanhas eleitorais.
Câmeras de televisão filmam a deputada Ângela Guadagnin (PT-SP) dançando entre as poltronas da Câmara, para comemorar a absolvição do colega. A deputada agita os braços e rebola. Arrisca passos de samba no meio do plenário. Ri o tempo todo. Dá um beijo em João Magno. Está feliz da vida.
A cena é reprisada várias vezes nos telejornais. Causa indignação. Fica conhecida como a “dança da impunidade”. Ângela Guadagnin é afastada do Conselho de Ética da Câmara. O jornalista Marcos Augusto Gonçalves, da Folha de S.Paulo, escreve:
“A indecência celebratória da ‘caminhada mais saltitante’ (como a parlamentar definiu a coisa) ficará como um símbolo do ruidoso naufrágio de um partido que se apresentava à sociedade como guardião dos bons costumes e reformador da ‘política tradicional’.”

Ângela Guadagnin não seria reeleita em 2006.

A Câmara também absolve o deputado Wanderval Santos (PL-SP), acusado de envolvimento no esquema do mensalão. A favor da cassação votam 242 parlamentares, 15 a menos que o número necessário. E 179 decidem absolvê-lo. Ele foi acusado de “terceirizar” o mandato para a Igreja Universal do Reino de Deus, da qual foi bispo até o início do escândalo. Um assessor do deputado sacou R$ 150 mil do valerioduto, em agência do Banco Rural.

A princípio, Wanderval Santos negou a retirada. Depois, negou ter dado ordem para o saque. Responsabilizou o ex-deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ), coordenador político da  igreja. Carlos Rodrigues renunciou ao mandato para evitar cassação. De Wanderval Santos:

- A verdade é que eu não sabia, não autorizei, não recebi e nem permiti que se recebesse qualquer valor do senhor Marcos Valério.
Dia 314
23/3/2006 O governo Lula decide envidar esforços para salvar Antonio Palocci (PT-SP).
Em vez de apurar as acusações de Francenildo Santos Costa contra o ministro, a Polícia Federal anuncia a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do caseiro. Ele é o escolhido para ser investigado pelos federais, sob comando do ministro Márcio Thomaz Bastos. O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras, do Ministério da Fazenda) também abre inquérito contra o rapaz. Os estrategistas do PT tentam descobrir motivação política para encobrir o que Francenildo viu na “casa dos prazeres”. 
Chamado a depor na Polícia Federal, o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, não aparece. Alega razões pessoais e manda dois advogados no lugar. A assessoria da Caixa divulga nota sobre o caso. Em vez de tratar o assunto como “crime de quebra de sigilo bancário”, usa o eufemismo “divulgação indevida” de extratos bancários. Lula afasta rumores sobre a queda de Jorge Mattoso. Palavras do presidente da República:
- Não faz sentido, não faz sentido! Mesmo porque sou eu que tenho que tomar a decisão.

O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Roberto Busato, fala em “sindicato do crime”:

- Não é possível que persista essa retaliação à pessoa que teve a coragem de testemunhar contra a segunda figura mais importante da República.

Dia 316
25/3/2006 A imprensa reúne informações sobre os bastidores da crise. A revista Época noticia que quinta-feira à tarde, dia 23, os ministros Antonio Palocci (PT-SP), Márcio Thomaz Bastos e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, mantiveram encontro sigiloso, no Palácio do Planalto. Palocci também teria se reunido com Lula. A reportagem de Gustavo Krieger relata que Mattoso disse ser impossível negar que o acesso aos extratos de Francenildo fora executado em computador dentro das dependências da Caixa.
Palocci pressionou Mattoso. Queria que ele assumisse a responsabilidade pela violação, e depois pedisse demissão. O presidente da Caixa não aceitou. O jornal O Estado de S. Paulo publica declaração de Jaques Wagner (PT-BA). O ministro das Relações Institucionais garante que o Palácio do Planalto não deu ordem para a quebra do sigilo bancário. Ora, se não foi Mattoso nem o Planalto, quem foi? A revista Veja dá uma pista: a CPI dos Bingos trabalha com a informação de que o jornalista Marcelo Netto, assessor de Palocci, foi mesmo o responsável por fazer chegar à revista Época os extratos bancários.
Dia 317
26/3/2006 A Folha de S.Paulo publica na primeira página o editorial “Abuso de poder”: “A desfaçatez, o uso sistemático da mentira, o empenho em desqualificar qualquer denúncia, nada disso constitui novidade no comportamento do governo Lula. Chegou-se nos últimos dias, entretanto, a níveis inéditos de degradação ética, de violência institucional e de afronta às normas da convivência democrática”. O jornal acrescenta:
“Na tentativa inútil de salvar a credibilidade em farrapos de um ministro, viola-se o sigilo bancário de um cidadão comum, o caseiro Francenildo Costa – enquanto toda sorte de malabarismos jurídicos e parlamentares protege as contas de Paulo Okamotto, celebrizado pelos nebulosos favores que prestou ao presidente. Fato ainda mais grave, o caseiro se torna alvo de investigação por parte da Polícia Federal, num ato indisfarçável de ameaça e abuso de poder. A iniciativa – tomada em tempo recorde – não tem paralelo na história recente do País, infelizmente pródiga em situações nas quais representantes do poder público se viram às voltas com denúncias sérias de corrupção.”
Dia 318
27/3/2006 Caem o ministro da Fazenda, Antonio Palocci (PT-SP), e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso. O destino do superministro é selado durante depoimento de Mattoso à Polícia Federal. O presidente da Caixa confessa que entregara pessoalmente a Palocci os extratos bancários de Francenildo. Mattoso é indiciado por violação ilegal de sigilo.
O presidente da Caixa admite que levou os documentos bancários do caseiro à casa de Palocci, na noite de 16 de março. Mattoso determinara ao assessor Ricardo Farhat Schumann que levantasse os dados de Francenildo. Ricardo Farhat Schumann, assim como Mattoso, é egresso da administração da ex-prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT). O assessor de Mattoso também atuou na administração do prefeito Celso Daniel (PT) em Santo André.
Lá, Ricardo Farhat Schumann foi denunciado por envolvimento em contratos firmados em caráter de emergência, sem licitação, que teriam causado prejuízos de R$ 9,6 milhões. Também perde o emprego o assessor de imprensa de Antonio Palocci, jornalista Marcelo Netto.
Comentário do caseiro Francenildo Costa:
- Está ficando provado que o lado mais fraco não é o do simples caseiro. É o da mentira.
Dia 319
28/3/2006 A imprensa reconstrói os momentos críticos da violação do sigilo bancário de Francenildo Santos Costa. Em reunião no Palácio do Planalto, na manhã de 16 de março, Lula e os ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos decidiram entrar com medida no STF (Supremo Tribunal Federal) para impedir o depoimento do caseiro à CPI dos Bingos.
Obtiveram sucesso.
Durante aquela tarde, Palocci e Jorge Mattoso, presidente da Caixa Econômica Federal, voltaram a se reunir no Palácio do Planalto, na sala ocupada pelo ministro, vizinha ao gabinete de Lula. Foi quando Palocci teria pedido a violação do sigilo bancário. Mattoso cumpriria a determinação.
As suspeitas sobre Francenildo Santos Costa vinham de informações de um jardineiro.
Ele contara à jornalista Helena Chagas, de O Globo, que o caseiro dispunha de dinheiro para comprar um terreno ou uma casa.
Naquela mesma noite, o presidente da Caixa telefonou para Palocci e informou que havia movimentações consideradas atípicas na conta bancária do caseiro. Ambos julgaram que Francenildo Santos Costa havia sido subornado pela oposição para atacar Palocci.

Jorge Mattoso se dirigiu em seguida à casa do ministro. Chegou lá às 23 horas. Entregou-lhe os extratos bancários e saiu em cinco minutos. Já estavam na residência Daniel Goldberg, secretário de Direito Econômico do Governo Federal, um auxiliar do ministro Márcio Thomaz Bastos. Também aguardava a documentação o jornalista Marcelo Netto, assessor de Palocci.

Coube a Marcelo Netto a tarefa de divulgar os extratos para a revista Época, onde trabalhava seu filho, o repórter Matheus Leitão. Registre-se que já havia passado pela casa do ministro Palocci o chefe de gabinete do ministro Márcio Thomaz Bastos, Cláudio Alencar.

Daniel Goldberg e Cláudio Alencar, aliás, estiveram duas vezes na casa de Palocci, naquele fatídico 16 de março.
A revista Veja relata que no auge da crise, no dia 23, Mattoso voltou à casa de Palocci, onde encontrou o advogado Arnaldo Malheiros, amigo de Márcio Thomaz Bastos. Durante a conversa, teria surgido a proposta de oferecer R$ 1 milhão para algum funcionário da Caixa assumir a autoria da quebra do sigilo. Informação adicional: Arnaldo Malheiros foi advogado dos ex-dirigentes do PT Delúbio Soares e Silvio Pereira, com honorários pagos pelo PT.
Veja revela que Mattoso contou toda a história da violação do sigilo bancário de Francenildo Santos Costa ao presidente Lula, em 24 de março. Ou seja, confessou o crime que teria sido executado a mando de Palocci, 72 horas antes do afastamento do ministro.
Ainda assim, Lula tentou segurá-lo.

Outro dado importante, noticiado pela Folha de S.Paulo: Márcio Thomaz Bastos foi informado por seus assessores da reunião da noite do dia 16 na casa de Palocci, logo no dia seguinte, 17 de março. Foi o dia em que a revista Época divulgou os extratos. Mesmo de posse da informação, o ministro da Justiça só teria contado a Lula o acontecido no dia 20.  
Estranho. Márcio Thomaz Bastos continuaria a elogiar Palocci, em todas as oportunidades.

De qualquer forma, Lula tinha informações comprometedoras contra o ministro da Fazenda ao menos uma semana antes da demissão ser consumada. Fez que não sabia?
Ora, Palocci ocupava sala ao lado do gabinete do presidente. Tinha acesso livre às dependências de Lula. Como imaginar que o presidente desconhecesse a conspiração urdida contra o caseiro?
Dia 320
29/3/2006 A CPI dos Correios divulga o relatório final das investigações. A comissão de inquérito rejeita a tese defendida pelo PT e o Palácio do Planalto, segundo a qual os pagamentos efetuados a deputados da base aliada do Governo Federal faziam parte apenas de um esquema de caixa 2, com vistas a quitar despesas de campanhas eleitorais. O mensalão existiu. O documento é assinado pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator dos trabalhos:
“Em verdade, é reduzir-se em demasia a inteligência dos brasileiros imaginar que será bastante dizer que os milhões não foram distribuídos a parlamentares, mas sim corresponderiam a caixa 2 de campanhas.”
O relatório afirma:
“Sem argumento para explicar o inexplicável, a defesa dos beneficiários foi a admissão de um crime, para evitar a confissão de outros praticados: a não-contabilização das despesas de 

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