quarta-feira, 7 de julho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6  CONTINUAÇÃO (PARTE 26)


Dia 124
14/9/2005 A Câmara dos Deputados cassa Roberto Jefferson (PTB-RJ). A interrupção do mandato do deputado, autor da denuncia do mensalão, é endossada por 313 parlamentares.
Outros 156 votam contra. Há ainda 13 abstenções, cinco votos em branco e dois nulos. O  petebista fica inelegível até 2015. Em discurso de 42 minutos, Roberto Jefferson acusa Lula de ser um presidente relapso. “Se ele não praticou o crime por ação, pelo menos por omissão”.

Roberto Jefferson afirma que tomou providências, assim que soube do esquema de pagamento da propina a deputados:

- Fiz uma peregrinação. Ao José Dirceu, como ministro-chefe da Casa Civil, falei isso umas dez vezes. Falei ao Ciro. Depois nós descobrimos que o Márcio, secretário-executivo do Ministério, tinha recebido do Marcos Valério R$ 500 mil para saldar contas de campanha.

Mas falei ao Ciro, com lealdade. Ele disse: “Eu não acredito nisso”. Falei ao ministro Miro Teixeira. Falei com o presidente.

Com a língua afiada, sua melhor característica, Roberto Jefferson ataca:

- Tirei a roupa do rei, mostrei ao Brasil quem são esses fariseus, mostrei ao Brasil o que é o governo Lula.

- Rufiões da pátria, proxenetas do parlamento. Este é o governo mais corrupto que testemunhei nos meus 23 anos de mandato, o mais escandaloso processo de aluguel de parlamentar.

- Meu conceito do presidente é que ele é malandro, preguiçoso. O negócio dele é passear de avião. Governar que é bom, ele não gosta.

Roberto Jefferson não perdoa o ex-ministro José Dirceu (PT-SP):

- O PT não tem projeto de governo. Eu quero dizer o PT, esse Campo Majoritário e essa cúpula que assaltou o Brasil. Rato magro, hein? Quem nunca comeu mel quando come se lambuza. Rato magro. PC Farias é aprendiz de feiticeiro ante essa gente que assaltou o Brasil. Rato magro. Mas eu nunca bati no peito para dizer que eu sou o paladino da ética e o campeão olímpico da moralidade. Todo fariseu e farsante emprega culpa ao adversário como se fosse um biombo para esconder os seus defeitos.

- O presidente escolheu o ministro José Dirceu como uma espécie de Jeany Mary Corner, o rufião do Planalto, para alugar prostitutas, algo que ele entendia poder fazer na Câmara dos Deputados. Tratou esta Casa como se fôssemos um prostíbulo.
O empresário Sebastião Buani apresenta prova contra o presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE). Entrega à Polícia Federal cópia de um cheque de R$ 7.500, em nome de Gabriela Kênia Martins, secretária de Severino. O dinheiro foi sacado em 30 de julho de 2002 e é indício de extorsão, crime de concussão praticado pelo deputado. Diz Buani:
- Este cheque foi entregue ao deputado no restaurante. Ele ia quase diariamente almoçar e ali dava o aperto. “Não esquece que hoje nós temos uns compromissos, não vai me deixar na mão”. Ele sempre dava um toque. Não deixa de ser um arrocho.
Naquele mês, período de férias no Congresso, o empresário alegou dificuldades para repassar o combinado a Severino, em razão do baixo movimento. Severino não quis saber.
Falou assim, segundo Sebastião Buani:
- Você tira da sua conta na Suíça.
Na Polícia Federal, a secretária Gabriela Kênia Martins confirma o saque de R$ 7.500.

E, como última tentativa de livrar Severino Cavalcanti, apresenta versão de que o dinheiro foi doação de Sebastião Buani ao próprio filho do deputado, Severino Cavalcanti Ferreira Júnior, morto depois em acidente de trânsito. Naquele ano, ele disputava uma vaga de deputado na Assembléia Legislativa de Pernambuco. Sebastião Buani nega.

Na hoste do PT, o líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), comenta a situação:

- Severino não aceita a hipótese de não trabalhar para esclarecer a verdade.
A frase é enrolada mesmo. Leia assim: Severino rejeita a hipótese de esclarecer a verdade.

A verdade, do mesmo dia 30 de julho de 2002: a secretária Gabriela Kênia Martins transferiu R$ 6.800 para a conta de Severino, após fazer a retirada dos R$ 7.500. Severino Cavalcanti pegou dinheiro de Sebastião Buani.
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim, concede liminar e impede o Conselho de Ética da Câmara de abrir processos contra seis deputados do PT, todos acusados de envolvimento no escândalo do mensalão. Nelson Jobim argumenta que os parlamentares não tiveram o direito a defesa prévia. Na prática, a decisão dá mais tempo para os deputados renunciarem aos mandatos, a fim de preservarem os direitos políticos.
Os beneficiados: Paulo Rocha (PA), Josias Gomes (BA), João Magno (MG), João Paulo Cunha (SP), Professor Luizinho (SP) e José Mentor (SP).
A boa notícia se espalha e, sem perder tempo, outros deputados mensaleiros também entram com o mesmo mandado no STF. São eles: José Dirceu (PT-SP), José Janene (PPPR), Pedro Corrêa (PP-PE), Pedro Henry (PP-MT), Vadão Gomes (PP-SP), José Borba (PMDB-PR) e Wanderval Santos (PL-SP).

Com base na liminar do STF, a Mesa Diretora da Câmara decide dar mais tempo para a defesa dos deputados acusados. Adia por cinco sessões a abertura dos processos de cassação.

No segundo mandato de Lula, Nelson Jobim (PMDB-RS) será nomeado ministro da Defesa.
Em depoimento à CPI do Mensalão, o presidente do PP, deputado Pedro Corrêa (PE),  afirma que o chefe de gabinete da liderança do partido, João Cláudio Genu, sacou apenas R$ 700 mil das contas de Marcos Valério. Segundo Valério, João Cláudio Genu recebeu R$ 4,1 milhões, entre setembro de 2003 e julho de 2004. Diz Pedro Corrêa:
- Nenhum outro saque feito por Genu nas agências do Banco Rural era do conhecimento do partido, nem foi autorizado pelo partido. Se houve saque, o dinheiro foi para pessoas que eu não conheço.

O dinheiro, pelo jeito, sumiu. Explicação de Corrêa para os R$ 700 mil:

- O Genu foi duas vezes ao Banco Rural sacar dinheiro para pagar os serviços do advogado Paulo Goyaz, que defendeu o deputado Ronivon Santiago em 36 ações.

Ronivon Santiago (PP-AC) ficou famoso com a confissão de que vendera por R$ 200 mil o voto a favor da emenda da reeleição, o que permitiu ao então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP) concorrer novamente ao Palácio do Planalto, em 1998.
Pedro Corrêa, por sua vez, informa que os tais R$ 700 mil do valerioduto não tiveram registro na contabilidade do partido. Nem quitaram dívidas de campanha eleitoral, como se vê.
De Pedro Corrêa:
- Não foi contabilizado porque o PT não esclareceu quem era o doador.

125
15 /9/2005 Relatório do TCU (Tribunal de Contas da União) entregue à CPI dos Correios aponta “irregularidades graves” em 15 de 54 contratos dos Correios. A auditoria encontrou indícios de favorecimento à empresa Novadata, do empresário Mauro Dutra, o “Maurinho”, amigo do presidente Lula, no valor de R$ 3,4 milhões. O consórcio Alpha, do qual a Novadata também faz parte, teria sido beneficiado irregularmente com R$ 5,5 milhões.
Há indícios de superfaturamento de R$ 53 milhões no contrato com a Skymaster, responsável  pelo transporte de cargas para os Correios, e de irregularidades na compra de 1.500 cofres da empresa Conan, com pagamento indevido de R$ 4,8 milhões. A SMPB, de Marcos Valério, foi apontada por cometer sete infrações no contrato com os Correios. Entre elas, recebimento de comissões sem a prestação de serviços, superfaturamento na aquisição de bens e prestação de serviços e subcontratações sem justificativas contratuais.
129
19/9/2005 Lula reúne-se a portas fechadas com o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE). A conversa leva uma hora. O Palácio do Planalto não permite que a reunião seja fotografada. Severino entrou pela garagem, para evitar ser visto em público.

Do que transpira do encontro, Severino Cavalcanti recebeu garantias do presidente de que o ministro das Cidades, Márcio Fortes (PP-RJ), será mantido no cargo. A indicação de Severino continuará valendo durante o segundo mandato de Lula.
O presidente da Câmara vai renunciar. Da mesma forma que Márcio Fortes, José Maurício Valadão Cavalcanti, filho de Severino, permanecerá no posto de superintendente federal de Agricultura em Pernambuco. Continuarão empregados em cargos de confiança na Câmara, ainda, os seguintes parentes de Severino: Olga Maria, nora; Catharina, filha; Marlene Cavalcanti, irmã; e Rafaella, neta. Todas com vencimentos entre R$ 1.600 e R$ 7.500.

O TCU (Tribunal de Contas da União) divulga resultado de auditoria que apontou indícios de lucros excessivos por parte da GDK, a empresa contratada pela Petrobras que ficou famosa ao dar um jipe Land Rover de presente ao ex-secretário-geral do PT, Silvio Pereira.

Auditores do TCM encontraram indícios de superfaturamento de R$ 7,2 milhões, e sobrepreços de outros R$ 48,9 milhões. O suspeito “lucro excessivo” também foi obtido por despesas financeiras em duplicidade, direcionamento de licitação e falhas na elaboração de orçamentos em dois contratos de R$ 160 milhões.
130
20/9/2005 Em depoimento conjunto às CPIs dos Correios, do Mensalão e dos Bingos, o doleiro Antonio Oliveira Claramunt, o “Toninho da Barcelona”, acusa conluio entre a corretora Bônus-Banval, Marcos Valério, PT e PP. Condenado a 25 anos por lavagem de dinheiro, Toninho da Barcelona chega à sessão algemado e protegido por forte esquema de segurança. Ele levanta dúvidas sobre os empréstimos que Marcos Valério e Delúbio Soares dizem ter tomado nos bancos Rural e BMG. Diz o doleiro:
- Esse tipo de operação é comum nos casos em que as partes interessadas desejam esquentar dinheiro de origem ilícita.
Para Toninho da Barcelona, os empréstimos seriam uma forma de “esquentar” o dinheiro que Marcos Valério e o PT já dispunham no exterior. O montante teria ingressado no Brasil pelo Trade Link Bank, um braço do Banco Rural que faz operações com empresas offshore.
Toninho da Barcelona afirma que Dario Messer, “o principal doleiro do PT”, enviava a moeda norte-americana do Panamá. A Barcelona Tour trocava os dólares por reais e entregava os valores convertidos à Bônus-Banval, cujo dono, Enivaldo Quadrado, era “amigo íntimo” do deputado José Dirceu. 
A corretora transferia o dinheiro para pessoas indicadas pelo PT e pelo PP, principalmente ao deputado José Janene (PP-PR). Toninho da Barcelona afirma ter trocado US$ 2 milhões, a pedido de Dario Messer, entre 3 de setembro e 9 de outubro de 2002. Era o auge da campanha que elegeu Lula. A bolada, convertida em reais, rendeu cerca de R$ 7 milhões.
Diz o doleiro:
- Esse dinheiro teve como destino a Bônus-Banval.
Toninho da Barcelona levanta suspeita contra o deputado José Mentor (PT-SP), relator da CPI do Banestado, que não o chamou para ser ouvido pela comissão. Os doleiros Dario Messer e Vivaldo Alves, o “Birigui”, tampouco prestaram depoimento. Para Toninho da Barcelona, José Mentor procurou proteger o ex-prefeito de São Paulo, Paulo Maluf (PPSP), em troca do apoio dele a Marta Suplicy (PT-SP), que disputava o segundo turno da reeleição à Prefeitura de São Paulo, em 2004:
- O Mentor sabia que eu podia citar o Birigui como operador do Maluf, e aí as coisas poderiam se complicar.

O deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) também é citado pelo doleiro. Toninho da Barcelona afirma que trocou dólares para Marcos, filho de Devanir, então vereador em São Paulo.
As operações ocorreram entre julho e setembro de 2002. Na sessão, Devanir procura intimidar o doleiro, ameaçando processá-lo.

Em resposta, Toninho da Barcelona enumera repasses feitos ao filho Marcos: US$ 30 mil em 10 de julho, US$ 25 mil em 17 de julho, US$ 20 mil em 5 de agosto, US$ 8,5 mil em 9 de agosto, US$ 10 mil em 10 de agosto e US$ 35 mil em 30 de setembro. Total: US$ 128,5 mil.

Parte do depoimento de Toninho da Barcelona é fechada ao público e restrita a apenas cinco parlamentares. O doleiro relata o que ouviu do doleiro Najun Turner, com quem ele estava preso na mesma cela. Os representantes do povo ouvem que o PT teria entregado R$ 8 milhões ao deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), em troca do seu apoio ao governo Lula.
Segundo o doleiro, a quantia foi paga nos meses de março e abril de 2005, após a eleição de Severino Cavalcanti à presidência da Câmara dos Deputados. De fato, o deputado foi eleito pela oposição, que pretendia derrotar Lula ao vencer o governista Luiz Eduardo  Greenhalgh (PT-SP), candidato do Palácio do Planalto a dirigir o Legislativo. Depois, porém, Severino bandeou-se para o lado do presidente da República.
Toninho da Barcelona diz que foram dois depósitos para Severino: um de R$ 5 milhões, providenciado pelo esquema de Marcos Valério, e outro de R$ 3 milhões, intermediado por Dario Messer. O dinheiro teria sido repassado ao deputado José Janene (PP-PR).
O doleiro abordou o esquema de corrupção em Santo André (SP). Segundo Toninho da Barcelona, o dinheiro proveniente da propina paga por empresas de ônibus era depositado num banco nos Estados Unidos.
131
21/9/2005 Renuncia o presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE). Ao abrir mão do mandato, evita a inelegibilidade até 2015, em caso de cassação. “Voltarei. O povo me absolverá”, diz ele, adaptando o título do livro de Fidel Castro, A História me Absolverá. Severino anuncia que disputaria as eleições de 2006. De fato, ele iria concorrer, mas não se elegeria deputado. Em 2008, seria eleito prefeito de João Alfredo (PE). No discurso de despedida da Câmara, Severino ataca os jornalistas:
- Sempre defendi a liberdade de imprensa. Mas, em nosso País, liberdade de imprensa tem sido a porta aberta para suspeitas sem comprovação, para acusações sem provas, para a destruição de reputações. Liberdade de imprensa, sim, mas o rigor da lei para os que enxovalham sem qualquer limite a honra e a dignidade alheias.
Das galerias da Câmara, os estudantes gritam:

- Vai embora, Severino, seu corrupto!

Seguranças entram em ação para esvaziar o recinto. Os estudantes, em coro:
- É mensalinho, é mensalão, queremos verbas para a Educação!

E mais, em ritmo de chacota:

- Congresso do mensalão, não vai prender nenhum ladrão!
Em depoimento à CPI dos Bingos, Jorge Luiz Dias, funcionário da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, acusa o ex-deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ), que renunciou ao mandato para evitar a cassação. É o caso do “mensalinho invertido”.

Segundo ele, Carlos Rodrigues, um ex-bispo e ex-coordenador político da Igreja Universal do Reino de Deus, exigia de R$ 10 mil a R$ 15 mil mensais, de 22 deputados federais e 29 estaduais, em troca de apoio. Funcionários dos deputados também eram obrigados a contribuir. Jorge Luiz Dias diz que Carlos Rodrigues faturava uma média de R$ 630 mil por mês.

Presente à sessão, Carlos Rodrigues nega as acusações, mas admite a força da Igreja Universal nas eleições:

- Um político com apoio da igreja salta do carro e tem 2 mil, 5 mil pessoas que dizem amém. O pastor diz: “Este é meu candidato, quero que vocês votem nele. Não quero só seu voto, mas os de sua família, seu pai, sua mãe, seu irmão, empregado e de seu patrão”. Todos levantam a mão.
De acordo com Jorge Luiz Dias, Waldomiro Diniz e Carlos Rodrigues montaram um esquema de corrupção na Loterj, a estatal que administra as loterias no Governo do Rio. O

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