sexta-feira, 25 de junho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTINUAÇÃO (Parte 14)


- O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil, sistematicamente.

Eu acho que as pessoas não pensaram direito no que estavam fazendo, porque o PT tem na ética uma das suas marcas mais extraordinárias. E não é por causa do erro de um dirigente ou de outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção.
A oposição vai para cima. Acusa o governo de engendrar uma nova Operação Uruguai, em alusão ao esquema simulado pelos aliados do ex-presidente Fernando Collor de Mello, em 1992, para tentar explicar a origem do dinheiro que financiava gastos do ex-presidente.
Na época, um empréstimo de US$ 3,7 milhões foi forjado para justificar despesas de Fernando Collor. O presidente acabou afastado do cargo, depois de um processo de impeachment.
Agora, a farsa contábil é a série de operações de crédito de Marcos Valério. Os falsos empréstimos serviriam para esquentar dinheiro de caixa 2 oriundo de fontes ilegais, usado em acertos com políticos da base aliada.

O jornal O Estado de S. Paulo traz uma lista com os nomes de 22 deputados do PP.
Testemunha cuja identidade é mantida em segredo aponta-os como destinatários de mensalões, distribuídos a mando do líder do partido, deputado José Janene (PR). Os operadores do esquema seriam João Cláudio Genu, chefe de gabinete de José Janene, e o deputado João Pizzolatti (PP-SC). Os locais de entrega da propina: o apartamento de Janene, em Brasília, e uma sala da Comissão de Minas e Energia, na Câmara dos Deputados. Segundo a denúncia, Pizzolatti circulava com o dinheiro dentro de malas, nos corredores da Câmara, protegido por funcionários da área de segurança do Congresso.
Um perfil de Marcelo Sereno, ex-secretário de Comunicação do PT e ex-chefe de gabinete de José Dirceu (PT-SP), de quem também foi assessor especial, é publicado pela Folha de S.Paulo. Para ilustrar a reportagem, a fotografia de um prédio de alto padrão na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, em cuja cobertura mora Marcelo Sereno. É atribuída a ele, ainda, a compra, em março de 2005, de um outro apartamento no Rio, no valor de R$ 700 mil.
Marcelo Sereno é acusado de “manipular” o Nucleos, fundo de pensão das estatais de energia nuclear. O objetivo seria levar dinheiro para as campanhas eleitorais do PT. Os repórteres Elvira Lobato e Leonardo Souza ouvem o petista Neildo de Souza Jorge, integrante do Conselho Deliberativo do Nucleos. Ele denuncia operações financeiras lesivas aos fundos de pensão:
- A grande mutreta é que eles compravam títulos públicos e depois vendiam com deságio para corretoras. Estas faturavam a corretagem e parte desse dinheiro, pelo que sabemos agora, iria para mensalões, caixas de campanha.

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18/7/2005 O Brasil debate o caixa 2. É crime de falsidade ideológica prestar informações fraudulentas sobre a arrecadação de dinheiro para campanhas políticas sem declarar os valores à Justiça Eleitoral. Omitir receitas é crime de sonegação fiscal. Para a legislação de crimes contra o sistema financeiro nacional, considera-se fraude a movimentação de recursos de forma paralela, à margem da contabilidade legal. O caixa 2 é crime contra a ordem tributária.
Na prática, porém, o uso de caixa 2 em campanhas eleitorais não recebe punição. No máximo, multa. Ninguém fica preso por crime eleitoral. Muito mais grave é dar propina a parlamentares. Neste caso, o crime de corrupção pode condenar a 12 anos de prisão, fora processos e outras penas, caso sejam constatadas formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. E isso sem mencionar a perda do mandato, por crime de responsabilidade ou falta de decoro parlamentar.
Por isso o esforço dos envolvidos no escândalo do mensalão para descaracterizar a existência de um esquema de suborno de parlamentares. Ao circunscrever tudo ao rol de crimes eleitorais, os delitos poderiam ser diluídos para um número grande de receptores, se possível anônimos, o que, afinal, dificultaria a comprovação e a responsabilização dos culpados.
Cai o presidente da Petrobras, o ex-senador José Eduardo Dutra (PT-SE). Em seu lugar assume José Sérgio Gabrielli, também filiado ao PT. Justificativa do governo para o afastamento:
José Eduardo Dutra vai disputar uma vaga no Senado em 2006. Faltam 15 meses para a eleição. Pela legislação, a desincompatibilização precisa ocorrer seis meses antes do pleito. História mal contada. Dutra acabaria derrotado em 2006, mas no ano seguinte voltaria a ocupar cargo importante no sistema Petrobras, o de presidente da BR Distribuidora.
Em 2009, apoiado por Lula, seria eleito presidente do PT.
Outras mudanças no governo: Antônio Batista Brito, diretor Comercial da Brasil Veículos, e Josenilton Andrade, do Centro Cultural Banco do Brasil, são afastados do Banco do Brasil. Motivo: reportagem do Correio Braziliense mostrou os dois pressionando um funcionário de baixo escalão. O episódio ocorreu no apartamento do petista Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, que participou da ação. Os três tentaram fazer o boy Luiz Eduardo Ferreira da Silva assumir a responsabilidade pelo saque de R$ 326 mil, o mesmo que motivou a saída de Henrique Pizzolato do Banco do Brasil. O dinheiro foi retirado pelo boy no Banco Rural, de conta bancária da agência de publicidade DNA, de Marcos Valério, e entregue a Henrique Pizzolato. Depois, o petista comprou um apartamento. O boy resistiu.
Em entrevista à Rádio Jovem Pan, de São Paulo, o respeitado senador Pedro Simon (PMDB-RS) comenta as acusações do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Para Pedro Simon, o escândalo do mensalão vem sendo comprovado por fatos novos, todos os dias, e é mais grave do que aquele que vitimou o ex-presidente Fernando Collor de Mello:

- A coisa lá, a Operação Uruguai e tudo mais, foi bem inferior. Lá eles usaram dinheiro das empresas, fizeram garantias, só que isso aconteceu com eles fora do governo. Agora, o partido está dentro do governo, e foram usadas empresas públicas como o Correio e Furnas para fazer transações ilícitas. Favoreceram essas empresas em troca do dinheiro dado ao partido. O nome disso é peculato, é formação de quadrilha.

De Roberto Busato, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil):

- Valério e Delúbio são personagens menores, nessa comédia infame que estarrece a nação. Valem menos pelo que são e mais pelos personagens que buscam inutilmente ocultar e aos quais serviram, com ações criminosas nos subterrâneos da política.
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19/7/2005 O escândalo do jipe Land Rover. Silvio Pereira está na CPI dos Correios, com habeas-corpus para não ser preso. Não precisa responder, se não quiser. Pode evitar perguntas, e mesmo cair em contradição. Não sairá algemado. Show de cinismo. O ex-secretáriogeral do PT nunca ouviu falar em mensalão. Não tem ideia sobre empréstimos de Marcos Valério ao PT.
O que fez “Silvinho”? Segundo a sua própria versão, apenas um banco de dados, com mais de 5 mil nomes, todos de pessoas prontas a assumir postos no governo Lula. Gentilmente, Silvinho informa aos integrantes da CPI: existem 1.400 cargos ocupados por filiados do PT na administração federal. O secretário-geral não se lembra se viajou no avião de César Roberto Santos Oliveira, vice-presidente da GDK, empresa contratada da Petrobras:
- Eu mantinha contatos institucionais com César Oliveira, mas repito que não intermediei interesses da empresa.
Silvinho cala-se. Recusa-se a dizer se ganhou um jipe Land Rover da GDK:
- Não falo sobre meu patrimônio, por orientação dos advogados.
O Jornal Nacional, da TV Globo, localiza o vendedor do jipe. O carro está em nome de Silvio Pereira. Um telefonema para o homem que fez o depósito, de R$ 73.500. Confirmado:
ele é funcionário da GDK.
José Paulo Boldrin, dono da revendedora de automóveis Eurobike, de Ribeirão Preto (SP), comprova o negócio. Recebeu o depósito de R$ 73.500 e vendeu o jipe, um Land Rover modelo Defender 90-SW, ano 2003. O carro já saiu da Eurobike em nome de Silvinho.
E foi entregue na residência do secretário-geral do PT, na cidade de São Paulo.
A GDK doou R$100 mil para a campanha de Lula. Em 2003, primeiro ano de governo, faturou R$ 145 milhões em contratos com a Petrobras. Em 2004, venceu dez licitações promovidas pela estatal. Total em jogo: R$ 512 milhões. O maior contrato foi para reformar a plataforma de extração de petróleo P-34, no valor de US$ 88 milhões. Em 2005, mais cinco contratos celebrados com a Petrobras, no valor de R$ 272 milhões.
Na campanha eleitoral de 2004, a GDK só deu dinheiro para uma campanha política.
Foi a de Osasco (SP), justamente o berço político de Silvinho. Doou R$ 400 mil para o candidato Emídio de Souza (PT), e com isso foi a maior doadora daquela campanha. O petista foi eleito.
Silvinho desliga-se do PT.
Evidências do mensalão. Deputados fizeram saques de dinheiro de contas das empresas de Valério, em agências do Banco Rural de Belo Horizonte e de Brasília. Documentos em poder da CPI dos Correios mostram autorizações de retiradas, beneficiando três deputados do PT, um do PP e um do PL.
Márcia Milanésio Cunha, mulher do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente da Câmara dos Deputados, sacou R$ 50 mil. Anita Leocádia Pereira Costa, assessora do deputado Paulo Rocha (PT-PA), o então líder do PT na Câmara, retirou R$ 470 mil. O deputado Josias Gomes (PT-BA) sacou duas vezes. Ele próprio, em pessoa, R$ 50 mil de cada vez. João Cláudio Genu, chefe de gabinete de José Janene (PR), líder do PP, levou R$ 1,1 milhão. Em nome do deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ) saíram R$ 150 mil.
Simone Vasconcelos, funcionária executiva de Marcos Valério e autora de vários dos pagamentos do mensalão, fez saques de R$ 6,1 milhões. Em outubro de 2003, em Brasília, Simone Vasconcelos efetuou duas retiradas, sendo uma de R$ 800 mil e outra de R$ 650 mil. O dinheiro foi entregue em carro-forte no escritório da SMPB na capital federal.
Tem mais: Jacinto Lamas, tesoureiro do PL, retirou R$ 1,3 milhão. As seguintes pessoas também fizeram saques: Vilmar Lacerda, presidente do PT do Distrito Federal. Total:
R$ 100 mil. Raimundo Ferreira da Silva Júnior, assessor do deputado Paulo Delgado (PT-MG). Total: R$ 100 mil. Roberto Costa Pinho, ex-assessor, com currículo extenso:
trabalhou para os ministros da Cultura e da Fazenda, Gilberto Gil e Antônio Palocci (PTSP), e para o senador Delcídio Amaral (PT-MS), presidente da CPI dos Correios. Total:
R$ 350 mil. José Luiz Alves, secretário de Governo da Prefeitura de Uberaba (MG).
Total: R$ 150 mil. O prefeito de Uberaba, Anderson Adauto (PL), aliás, foi ministro dos Transportes de Lula. E Solange Pereira de Oliveira, funcionária da tesouraria do PT de São Paulo. Total: R$ 100 mil.
Brasília vive um corre-corre. João Paulo Cunha (PT-SP) não comenta. Sai-se com um “tudo tem explicação”. O deputado Professor Luizinho (PT-SP) defende João Paulo Cunha:
- A informação que tenho, do próprio João Paulo, é de que a Márcia esteve no Rural para resolver problema da televisão a cabo.
O ex-ministro Anderson Adauto não foge da briga. Segundo ele, Delúbio Soares, o tesoureiro do PT, o ajudou a pagar uma dívida de campanha:
- Encerrei 2002, quando me elegi deputado federal, com uma dívida de campanha. Então, pedi para o Delúbio e ele me ajudou. Não sei precisar a quantia, mas foi entre R$ 100 mil e R$ 150 mil.
Foram R$ 150 mil, e Anderson Adauto era o ministro dos Transportes:
- Não vejo nenhuma irregularidade em ser ajudado para pagar dívidas de campanha.
Nas fileiras do PT, algumas “explicações”: Vilmar Lacerda recebeu dinheiro para pagar dívidas de campanha. Solange Pereira de Oliveira, do Diretório de São Paulo, não quer comentar. E Raimundo Ferreira da Silva Júnior, que também é vice-presidente do PT do Distrito Federal, cumpriu ordens de Delúbio Soares. Buscou o envelope, mas não sabia quanto tinha dentro:
- O Delúbio me ligou de São Paulo e pediu para que eu fosse até a agencia do Rural, onde deveria pegar um dinheiro que ele estava precisando para umas despesas. Ele me disse que precisava de alguém de confiança para buscar o pacote. Como sou amigo dele, nada mais natural.
Cai Marco Antônio Silva, diretor de eventos da Secom, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Era um dos mais importantes auxiliares do ex-ministro Luiz Gushiken (PT-SP). Militante do PT, foi acusado de favorecimento ilícito e tráfico de influência.
É casado com Telma dos Reis Menezes da Silva, funcionária da Multi Action, empresa de organização de eventos de Marcos Valério. Em um ano de governo Lula, a Multi Action movimentou R$ 28 milhões.
Marco Antônio Silva integrou a comissão julgadora da licitação que escolheu a agência de publicidade contratada pelos Correios. Venceu a SMPB, de Marcos Valério. Contratada a SMPB, a Multi Action foi chamada para prestar serviços aos Correios.
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20/7/2005 Mais evidências do mensalão. A CPI dos Correios usa os dados da quebra do sigilo bancário de Marcos Valério para identificar o caminho do dinheiro. Surge Zilmar Fernandes da Silveira, sócia do publicitário Duda Mendonça. Foi identificada retirada de Zilmar Fernandes da Silveira de R$ 250 mil. Duda Mendonça foi o responsável pela campanha eleitoral de 2002, que elegeu Lula pela primeira vez. Além de orientar ações do presidente, Duda Mendonça gerencia contratos de publicidade da Petrobras, Ministério da Saúde e Secom, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República.

Rodrigo Barroso Fernandes, assessor do prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), sacou R$ 274 mil. Com a notícia, é desligado da Prefeitura. E começa a novela de um tal Roberto Marques, amigo de José Dirceu (PT-SP) que fugiu feito o diabo da cruz para não esclarecer determinada retirada de R$ 50 mil.
Outros nomes: Paulo Menegucci, diretor dos Correios. Recebeu R$ 205 mil. Jair dos Santos, motorista do ex-presidente do PTB, Flávio Martinez. Sacou R$ 300 mil. Nestor Francisco de Oliveira, assessor do deputado Roberto Brant (PFL-MG). Pegou R$ 102 mil no banco. Cantídio Cotta Figueiredo, candidato a deputado pelo PTB. Sacou R$ 68 mil.
Luiz Carlos de Miranda Faria, outro candidato do PTB. Fez retirada de R$ 68 mil. Benoni Nascimento de Moura, da corretora Bônus-Banval. Pôs a mão em R$ 255 mil. E Luiz Carlos Masano, também ligado à Bônus-Banval, recebeu R$ 50 mil. Suspeita-se das ligações da Bônus-Banval com o deputado José Janene (PP-PR).
Chamam a atenção, ainda, os saques atribuídos a David Rodrigues Alves, um policial mineiro, no valor de R$ 4,9 milhões. Localizado, o policial explica que foi contratado por Cristiano de Mello Paz, sócio de Marcos Valério.
A versão dele: recebia entre R$ 50 e R$ 100, sempre que ia buscar dinheiro no Banco Rural. Levava a grana diretamente a Cristiano de Mello Paz, na SMPB em Belo Horizonte.
Diz o policial:
- Os pacotes já estavam prontos nas agências, eu apenas assinava o recebimento. Meu trabalho era retirar o dinheiro e entregar na SMPB. Quero deixar claro que eu fazia a retirada do dinheiro do banco. Eu não sacava e não sei de quem era o dinheiro.
Cristiano de Mello Paz, o sócio de Marcos Valério, informa, por meio da assessoria, que não conhece o policial. David Rodrigues Alves devolve, à altura: foi apresentado a Cristiano Paz por um doleiro, Haroldo Bicalho.
Chega ao Conselho de Ética da Câmara o teor de um depoimento prestado à Polícia Federal. É de Simone Vasconcelos, apresentada como diretora administrativa e financeira da SMPB, a agência de publicidade de Valério.

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