quinta-feira, 24 de junho de 2010

Autor do Livro: Jornalista Ivo Patarra
CAPÍTULO 6 CONTUAÇÃO (PARTE 13)


Soares”, “contraiu vários empréstimos bancários em nome das agências de publicidade SMPB e DNA, no período de 2003 a 2005”.
A nota, estratégia de defesa, diz que o dinheiro, “a título de empréstimos”, foi depositado “na rede bancária para pessoas indicadas pelo então secretário de Finanças do PT, senhor Delúbio Soares”. Em seguida, o empresário menciona que o dinheiro, segundo determinação de Delúbio Soares, servia para “saldar dívidas relacionadas a campanhas eleitorais”.
O reconhecimento de que Marcos Valério participou de esquema para financiar o PT é manchete dos principais jornais do País. Poucos se dão conta da manobra: desviar as investigações do pagamento de propina. Em vez do mensalão, ou seja, do dinheiro entregue a parlamentares da base aliada do governo, crime grave de corrupção, a estratégia é fazer crer que o dinheiro foi repassado para pagar dívidas de campanha. Apenas um mero crime eleitoral.
Em entrevista ao Jornal Nacional, Marcos Valério não fornece nomes, valores, número de operações bancárias, nem formas de ressarcimento do que teria sido emprestado ao PT.
Nega a existência de malas para pagar grandes somas e de favorecimentos às suas empresas por parte de gente do governo.
A Folha de S.Paulo publica detalhes de alguns depoimentos secretos prestados à Corregedoria da Câmara dos Deputados. A reportagem conseguiu ler transcrições em notas taquigráficas. Num deles, José Genoino admite que Silvio Pereira usava mesmo sala do Ministério da Casa Civil, no Palácio do Planalto, para discutir a divisão de cargos federais entre os partidos da base aliada. Declaração de José Genoino:

- Ele conversava com os demais partidos e era o encarregado quando tinha conflitos. E tinha muitos conflitos com os partidos da base aliada. Ele fazia isso ou na sede do PT ou na  liderança. Ou então na sala de reuniões ordinárias da Casa Civil.
Em outro depoimento, Emerson Palmieri, tesoureiro informal do PTB, afirmou que Marcos Valério havia sido designado pelo PT para obter R$ 20 milhões de empresários. O dinheiro seria repassado ao PTB nas eleições de 2004. O acerto foi feito em reuniões das quais participaram José Genoino, Delúbio Soares, Silvio Pereira, Marcelo Sereno, Roberto Jefferson e ele próprio, Emerson Palmieri.
O tesoureiro também contou detalhes dos R$ 4 milhões entregues por Valério. Foram dois pagamentos. O dinheiro chegou em duas malas “de rodinhas”, em notas de R$ 50, na maioria, e umas “poucas notas de R$ 100”.
O jornal Correio Braziliense traz a história do apartamento de Henrique Pizzolato. O diretor de Marketing do Banco do Brasil, afastado do cargo, comprou o imóvel de 160 metros quadrados por R$ 400 mil, em endereço dos mais valorizados do Rio de Janeiro, a uma quadra da praia de Copacabana.
Detalhe: neste mesmo dia da revelação do Correio Braziliense, um grupo de auditores da Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, toma depoimento do officeboy Luiz Eduardo Ferreira da Silva. Ele conta que em 15 de janeiro de 2004, cerca de um mês antes da compra do apartamento em Copacabana, sacou R$ 326 mil de conta da DNA Propaganda em agência do Banco Rural do centro do Rio. E levou o pacote diretamente a Henrique Pizzolato.
O relator da CPI dos Correios, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), desabafa durante entrevista em Curitiba:
- Nunca imaginei que houvesse algo nesse sentido no País, independentemente de governo.
Não significa que não possa ter existido em outros governos, mas na minha ótica pensei que, apesar de tudo o que se diz, nosso País não tivesse tantos tropeços no entrelaçamento entre a administração, políticos e empresas.
Dia 64
16/7/2005 Depois de Marcos Valério, a vez de Delúbio Soares apresentar a versão de que não houve o esquema do mensalão, ou seja, pagamentos de propina a parlamentares da base aliada do governo Lula, em troca de apoio no Congresso. O que houve, simples assim, foram repasses para quitar dívidas de campanha, por meio de caixa 2. Delúbio leva a explicação espontaneamente ao procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza.
O depoimento de Delúbio vaza em seguida para a imprensa. Faz parte da estratégia. Os jornais dão destaque. Delúbio procurou usar o procurador-geral para passar o recado de que o PT recebera cerca de R$ 40 milhões em empréstimos, mas, de maneira nenhuma, assegurava o tesoureiro, o dinheiro era fruto do desvio de verbas públicas ou teve sua origem no superfaturamento de contratos com estatais. Importante: os milhões, conforme frisara Valério, foram usados para acertar despesas de campanhas eleitorais, tão-somente.
A revista Veja não deixa por menos. A reportagem de capa, “Mensalão – quando e como Lula foi alertado”, descreve cinco situações nas quais informações sobre o esquema de pagamento de propina chegaram aos ouvidos do presidente da República. A primeira vez, em 25 de fevereiro de 2004, por meio do deputado Miro Teixeira (RJ), na época filiado ao PT. O episódio ocorreu duas semanas após a queda de Wadomiro Diniz.
Escreve o repórter Otávio Cabral: “Waldomiro Diniz, na condição de braço-direito de José Dirceu, era quem cuidava da relação do governo com o Congresso e, com sua demissão, os credores do mensalão entraram em polvorosa. Miro Teixeira, que havia apenas três semanas assumira a liderança do governo na Câmara, começou a ser procurado pela tropa interessada em saber como seria paga a mesada dali em diante. O deputado ficou estupefato.
Não sabia o que era mensalão. Entre os dias 17 e 19 de fevereiro, Miro Teixeira recebeu várias sondagens. Numa delas, na manhã do dia 17, a pressão veio em comitiva. Eram três deputados juntos, querendo saber do futuro financeiro: Valdemar Costa Neto, presidente do PL, Sandro Mabel, líder do PL, e Pedro Henry do PP”.
Miro Teixeira conversou reservadamente com Lula. Disse que deixaria o cargo de líder do governo por causa do mensalão. A revista Veja documenta:
“Lula demonstrou surpresa, disse que nunca ouvira falar naquilo e prometeu conversar com o então ministro José Dirceu para apurar a denúncia – mas não voltou a tocar no assunto. No dia 31 de março, Miro voltou ao Palácio do Planalto e, diante do fato de que nada fora feito a respeito do mensalão, pediu para deixar a liderança. Saiu no dia 6 de abril, sendo substituído pelo Professor Luizinho.”
O segundo aviso ao presidente, em 5 de maio de 2004. Quem deu foi o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). O Palácio do Planalto, em comunicado oficial, deu a seguinte explicação à revista: Lula não se recorda de ter ouvido nenhum comentário de Marconi Perillo sobre o assunto.
O governador Marconi Perillo, no entanto, chegou a ilustrar a conversa com o presidente da República ao mencionar os casos de dois deputados de Goiás. Um deles virou escândalo.
É o da deputada Raquel Teixeira (PSDB), a quem o deputado Sandro Mabel (PL) teria oferecido dinheiro para que se mudasse para o PL. Sobre o outro, o governador não deu detalhes. O motivo: o deputado Enio Tatico, do PSC, aceitou a proposta e se transferiu para o PL. Enio Tatico apresentou justificativa para a mudança:
- Mudei de partido porque o líder do PL é de Goiás e é meu amigo. Não recebi proposta.

O terceiro episódio. O próprio presidente abordou o assunto, durante viagem oficial à hina. Aconteceu em 25 de maio de 2004. Durante um jantar, Lula perguntou ao deputado Paulo Rocha (PT-PA) se ele já ouvira falar sobre o pagamento de mesadas a deputados.

Paulo Rocha negou ter ocorrido a indagação do presidente, mas dez deputados estavam na mesa do jantar. Três deles confirmaram a veracidade da conversa.

Nos outros dois casos, o aviso foi dado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). No primeiro deles, em 5 de janeiro de 2005, o ministro Walfrido dos Mares Guia (PTB-MG) testemunhou a conversa. No segundo, em 23 de março de 2005, parte da alta cúpula do governo estava presente, no gabinete de Lula no Palácio do Planalto: José Dirceu (PT-SP), ministro da Casa Civil; Aldo Rebelo (PC do B-SP), ministro das Relações Institucionais; Walfrido dos Mares Guia, do Turismo; Gilberto Carvalho (PT-SP), chefe de gabinete do presidente; Arlindo Chinaglia (PT-SP), líder do governo na Câmara; e o deputado José Múcio (PTB-PE). A reportagem conclui:
“Se soube do assunto e não tomou providências, Lula pode ser acusado de crime de responsabilidade, previsto nos artigos 84 e 85 da Constituição e, também, na Lei nº 1.079, editada em 1950, conhecida como Lei do Impeachment. Pela lei, o presidente, se soube do mensalão, tinha de ter mandado apurar. ‘Se o presidente teve ciência disso, caracteriza-se uma omissão, que é um caso típico de crime de responsabilidade’, afirma o jurista Miguel Reale Júnior, que redigiu a petição que resultou no impeachment de Fernando Collor, em 1992.”
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17/7/2005 Em surpreendente entrevista concedida na França e exibida no programa Fantástico, da Rede Globo, Lula faz coro às recentes versões sobre a crise política, que foram manifestadas por Delúbio Soares e Marcos Valério. Dessa forma, fecha a manobra para convencer a sociedade brasileira: houve “erros”, sim, mas apenas decorrentes de empréstimos e operações de crédito, usados para pagar dívidas de campanha, por caixa 2. A versão oficial minimiza o escândalo do mensalão à manipulação de verbas não-declaradas.
Lula esforça-se para reduzir o problema. Exime-se de qualquer ato indevido, pois “já faz tempo que eu deixei de ser presidente do PT”. Para o presidente da República, “o PT tem que explicar à sociedade brasileira que erros cometeu”:

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