Histórias em Português
Um blog onde o Clube das Histórias coloca histórias de que gosta e que
quer partilhar. Sirva-se e dê-lhes vida! Quer também recebê-las por email?
Procura histórias sobre um algum tema ou para um fim específico?
Escreva-nos! estorias.em.portugues(at)gmail.com os nossos objectivos
são meramente pedagógicos, sem qualquer interesse financeiro.
Ainda há
espaço para a alegria?
O ano que agora começa não vai ser propriamente um tempo festivo. Por
isso, poderá parecer ao leitor que este tema é uma dolorosa provocação. Mas não
é: falo muito a sério.
A alegria é um sentimento sem o qual os humanos não podem viver. Mesmo
na noite mais escura, em que a dor, o sofrimento e o choro encharcam a nossa
alma, se não encontrarmos um espaçozinho para a verdadeira alegria,
dificilmente suportaremos tal situação.
É claro que há várias formas de alegria e nem todas produzem esse
efeito libertador.
Há a alegria de aviário, que não tem consistência, usa-se quando a
circunstância a exige, mas não tem nada por detrás. É como a carne dos frangos
produzidos em série, obrigados a crescer à pressão, com um sabor sem sabor,
filhos de hormonas e antibióticos insossos.
Há a alegria industrializada, que estrondeia nas vielas da noite,
alimentada a combustíveis etílicos ou a passas que não são de uva. É hoje
muito estimada por industriais legais de drogas ilegais que se alimentam da sua
distribuição bem lucrativa e muito desejada, porque gera euforias momentâneas
a quem as usa e lhe dá bravata para tomar atitudes das quais, em estado sóbrio,
se envergonharia.
Há a alegria amarela, que se espelha num sorriso dessa cor, para
disfarçar uma desilusão ou vir em socorro da vítima de uma qualquer partida de
colegas ou da vida. Por detrás está a frustração que se quer esconder e se
possível ignorar.
Há a alegria «de café» que, na sua ambiguidade, tanto pode ser um ato
de superficialidade balofa como uma genuína manifestação de contentamento,
que reforça as relações interpessoais.
Há a alegria franca que ressoa na gargalhada cristalina. Brota do fundo
da nossa dimensão lúdica e ajuda a suportar com estoicismo angústias e medos
que a vida nos põe a cada curva.
Há a alegria interior que faz «pouco ruído» mas sempre se pode
encontrar na limpidez de um olhar tão transparente que chega ao fundo da alma.
O olho é o espelho da alma. Quantos doentes, às vezes em estado quase terminal,
continuam a irradiar um olhar sereno, a apresentar uma face risonha, a
iluminar os que estão à sua volta.
Só esta alegria é capaz de ultrapassar as maiores dificuldades. Não se
trata de uma alegria exterior que disfarça a amargura nem de uma alegria
hipócrita que pensa enganar a dura realidade, fugindo ou ignorando-a. É, antes,
a alegria dos fortes, que aceitam que a vida é feita de tempos felizes e tempos
dolorosos e que uns e outros têm de ser vividos com serenidade, a alegria que
evita angústias doentias ou euforias alienantes.
Esta alegria nasce do fundo de nós próprios, do facto de estarmos
vivos, de acreditarmos em nós próprios, de nos reconhecermos «pessoas»,
sujeitos livres e conscientes da Vida e da História.
Neste ano vamos precisar muito de aprender a viver e a expressar esta
alegria.
É necessário expressá-la para nos ajudarmos a nós mesmos e também para
contagiar os que vivem perto de nós. Em tempos de crise, a alegria pode ser e
é uma forma privilegiada de ajuda aos outros.
José Dias da Silva
Nenhum comentário:
Postar um comentário